sábado, 14 de março de 2020

Querida Amazônia: Caminhos de inculturação na Amazônia - nºs 70 a 72


Para conseguir uma renovada inculturação do Evangelho na Amazônia, a Igreja precisa de escutar a sua sabedoria ancestral, voltar a dar voz aos idosos, reconhecer os valores presentes no estilo de vida das comunidades nativas, recuperar a tempo as preciosas narrações dos povos. Na Amazônia, já recebemos riquezas que provêm das culturas pré-colombianas, tais como a abertura à ação de Deus, o sentido da gratidão pelos frutos da terra, o caráter sagrado da vida humana e a valorização da família, o sentido de solidariedade e a corresponsabilidade no trabalho comum, a importância do cultual, a crença em uma vida para além da terrena e tantos outros valores.

Neste contexto, os povos indígenas da Amazônia expressam a autêntica qualidade de vida como um bem viver, que implica uma harmonia pessoal, familiar, comunitária e cósmica e manifesta-se no seu modo comunitário de conceber a existência, na capacidade de encontrar alegria e plenitude numa vida austera e simples, bem como no cuidado responsável da natureza que preserva os recursos para as gerações futuras. Os povos aborígenes podem ajudar-nos a descobrir o que é uma sobriedade feliz e, nesta linha, têm muito para nos ensinar. Sabem ser felizes com pouco, gozam dos pequenos dons de Deus sem acumular tantas coisas, não destroem sem necessidade, preservam os ecossistemas e reconhecem que a terra, ao mesmo tempo que se oferece para sustentar a sua vida, como uma fonte generosa, tem um sentido materno que suscita respeitosa ternura. Tudo isto deve ser valorizado e recebido na evangelização.

Enquanto lutamos por eles e com eles, somos chamados a ser seus amigos, a escutá-los, a compreendê-los e a acolher a misteriosa sabedoria que Deus nos quer comunicar através deles. Os habitantes das cidades precisam de apreciar esta sabedoria e deixar-se reeducar quanto ao consumismo ansioso e ao isolamento urbano. A própria Igreja pode ser um veículo capaz de ajudar esta recuperação cultural numa válida síntese com o anúncio do Evangelho. Além disso, torna-se instrumento de caridade, na medida em que as comunidades urbanas forem não apenas missionárias no seu ambiente, mas também acolhedoras dos pobres que chegam do interior acossados pela miséria. É-o, igualmente, na medida em que as comunidades estiverem próximas dos jovens migrantes para os ajudarem a integrar-se na cidade sem cair nas suas redes de degradação. Tais ações eclesiais, que brotam do amor, são caminhos valiosos dentro dum processo de inculturação.

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