No dia 30 de setembro a Igreja celebra a memória de São Jerônimo, e o Dia da Bíblia.
São Jerônimo de quem é conhecida a célebre frase: “ignorar as Escrituras é ignorar a Cristo”, estudou latim, grego e hebraico para melhor compreender as Escrituras e fazer traduções de muitos textos bíblicos, como a “Vulgata”, a primeira tradução da Bíblia para o latim; ele também era um enciclopédico, filósofo, teólogo, retórico e dialético. Neste 16º centenário da morte de São Jerônimo – que faleceu no ano de 420 com, praticamente, 80 anos de idade – o Papa Francisco assinou a Carta Apostólica “Sacrae Scripturae affectus” – Afeto à Sagrada Escritura:
“O afeto à Sagrada Escritura,
um terno e vivo amor à Palavra de Deus escrita é a herança que São Jerônimo,
com a sua vida e as suas obras, deixou à Igreja. Tais expressões, tiradas da
memória litúrgica do Santo, nos dão uma chave de leitura indispensável
para conhecermos, no XVI centenário da morte, a sua figura saliente na história
da Igreja e o seu grande amor a Cristo”.
Na Introdução do documento o
Papa recorda a vida do santo, seu percurso, seus estudos que iniciaram a partir
da visão, talvez na Quaresma de 375: “Aquele episódio da sua vida concorre para
a decisão de se dedicar inteiramente a Cristo e à sua Palavra, consagrando a
sua existência a tornar as palavras divinas cada vez mais acessíveis aos
outros, com o seu trabalho incansável de tradutor e comentador”. E afirma:
“Colocando-se à escuta na Sagrada Escritura, Jerônimo encontra-se a si mesmo,
encontra o rosto de Deus e o dos irmãos, e apura a sua predileção pela vida
comunitária”.
“Para uma plena compreensão da
personalidade de São Jerônimo – explica o Papa - é necessário combinar duas
dimensões caraterísticas da sua existência de crente: por um lado, a
consagração absoluta e rigorosa a Deus, renunciando a qualquer satisfação
humana, por amor de Cristo crucificado (cf. 1 Cor 2, 2; Flp 3, 8.10); por
outro, o empenho assíduo no estudo, visando exclusivamente uma compreensão cada
vez maior do mistério do Senhor. É precisamente este duplo testemunho,
admiravelmente oferecido por São Jerônimo, que se propõe como modelo, antes de
tudo, para os monges, a fim de encorajar quem vive de ascese e oração a
dedicar-se ao labor assíduo da pesquisa e do pensamento; e, depois, para os
estudiosos a fim de se recordarem que o conhecimento só é válido religiosamente
se estiver fundado no amor exclusivo a Deus, no despojamento de toda a ambição
humana e de toda a aspiração mundana”.
Recordando o amor do santo
pela Sagrada Escritura o Pontífice destaca que “nos últimos tempos, os exegetas
descobriram a genialidade narrativa e poética da Bíblia, exaltada precisamente
pela sua qualidade expressiva; Jerônimo, ao contrário, destacava mais, na
Escritura, o caráter humilde com que Deus Se revelou expressando-se na natureza
áspera e quase primitiva da língua hebraica, quando comparada com o primor do
latim ciceroniano. Portanto, não é por um gosto estético que ele se dedica à
Sagrada Escritura, mas apenas – como é bem sabido – porque ela o leva a
conhecer Cristo, pois a ignorância das Escrituras é ignorância de Cristo”.
“O amor apaixonado de São
Jerônimo às divinas Escrituras está imbuído de obediência: antes de tudo,
obediência a Deus, que Se comunicou em palavras que exigem escuta
reverente e, consequentemente, obediência também a quantos na Igreja
representam a tradição interpretativa viva da mensagem revelada”.
“Mas – lê-se na Carta - para
os leitores de língua latina, não existia uma versão completa da Bíblia na sua
língua; havia apenas algumas traduções, parciais e incompletas, feitas a partir
do grego. Cabe a Jerônimo – e, depois dele, aos seus continuadores – o mérito
de ter empreendido uma revisão e uma nova tradução de toda a Escritura. Tendo
começado em Roma, com o encorajamento do Papa Dâmaso, a revisão dos Evangelhos
e dos Salmos, depois, já no seu retiro em Belém, lançou-se à tradução de todos
os livros veterotestamentários diretamente do hebraico; uma obra, que se
prolongou por vários anos”.
“Com esta sua tradução,
Jerônimo conseguiu ‘inculturar’ a Bíblia na língua e cultura latinas,
tornando-se esta operação um paradigma permanente para a ação missionária da
Igreja”. Na verdade, ‘quando uma comunidade acolhe o anúncio da salvação, o
Espírito Santo fecunda a sua cultura com a força transformadora do
Evangelho’, estabelecendo-se assim uma espécie de circularidade: se a
tradução de Jerônimo é devedora à língua e à cultura dos clássicos latinos,
cujos vestígios são bem visíveis, por sua vez ela, com a sua linguagem e o seu
conteúdo simbólico e rico de imagens, tornou-se um elemento criador de
cultura”.
Por fim, o Papa faz um apelo:
“Entre muitos elogios feitos a São Jerônimo pelos seus vindouros, encontra-se
este: não foi considerado simplesmente um dos maiores cultores da ‘biblioteca’
de que se nutre o cristianismo ao longo dos tempos, a começar pelo tesouro da
Sagrada Escritura, mas se aplica aquilo que ele mesmo escreveu sobre Nepociano:
‘Com a leitura assídua e a meditação constante, fizera do seu coração uma
biblioteca de Cristo’. Recordando que “Jerônimo não poupou esforços para enriquecer
a sua biblioteca, vendo nela um laboratório indispensável para a compreensão da
fé e para a vida espiritual; e, nisto, constitui um exemplo admirável também
para o presente”.
“Verdadeiramente Jerônimo é a
‘Biblioteca de Cristo’, uma biblioteca perene que, passados dezesseis séculos,
continua a ensinar-nos o que significa o amor de Cristo, um amor inseparável do
encontro com a sua Palavra”.
Leia a íntegra da Carta Apostólica Afeto à Sagrada Escritura