Carlos, aclamado pelo povo como “o Bom”, era filho de São
Canuto, rei da Dinamarca. Órfão de pai com apenas cinco anos de idade, pela
mãe, Adélia de Flandres, foi conduzido para a corte do avô, o conde de
Flandres, que se fixava em Bruges.
Moço, foi armado cavaleiro, e, com um tio, Roberto, tomou parte numa das
cruzadas contra os infiéis na Terra Santa. De volta, coberto de glória,
esperava-o o poder: um primo germânico, Balduíno, que sucedera ao conde de
Flandres, legava-lhe o condado.
Homem que amava profundamente a justiça e que tinha
predileção muito especial pelos oprimidos, pelos pobrezinhos, dos quais era pai
e protetor, Carlos conquistou, num átimo, o apelido de o Bom.
Assistia o conde, todos os dias, à santa Missa, e quando
podia, às vésperas, na igreja de São Pedro de Gand. Tinha sempre, ao lado, três
religiosos, doutores em teologia, que todas as noites, depois do jantar, lhe
explicavam um ou dois capítulos da Bíblia, lições que ouvia com grande
interesse e singular prazer. E tanto amava a Deus, que proibiu aos súditos
jurar pelo seu santo nome: quem o fizesse, estava sujeito a perder, conforme a
maior ou menor gravidade do caso, uma das mãos ou um pé.
Justiceiro por excelência, era o terror dos maus dos que
oprimiam os pobres, extorquiam viúvas e perseguiam órfãos.
Quando o imperador romano desapareceu sem deixar herdeiros,
cuidou-se de sua eleição, mas o conde que já se negara a aceitar o reinado de
Jerusalém, declinou do cetro.
Desprendido das coisas do mundo, simples, afável, e
caridoso, Carlos teve ocasião de mostrá-lo quando uma grande fome assolou as
Flandres: todos os dias, invariavelmente, cuidava de cem pobres de Bruges,
alimentando-os e vestindo. E a Tancmar, seu capelão, encarregou de fiscalizar
os vendedores, para que não exorbitassem no preço dos gêneros alimentícios,
obrigando-os a vendê-los razoavelmente.
Carlos, o Bom, foi morto por Burchard, um incitador de
revoltas, inconformado por não ter auferido grandes lucros, quando daquela
fome. Todas as manhãs, o conde ia ouvir a missa numa capela da igreja de São
Donaciano, ao lado do castelo.
Burchard, sabedor daquele hábito, ali apareceu com alguns cúmplices.
Carlos, de joelhos, cantava em alta voz um salmo. O matador, sorrateiramente,
avançou para ele. Uma mulher, vendo-o puxar da espada, gritou:
- Senhor conde, levanta-te e guarda-te!
Era tarde, porém, porque Burchard já lhe dirigira uma
certeira e funda estocada ao pescoço, e os outros assassinos acabaram de
matá-lo, furiosamente.
O corpo de Carlos, enterrado no mesmo lugar que o
trucidaram, foi, mais tarde, transferido - estava perfeitamente conservado -
para a Igreja de São Cristovão.
O culto do Beato filho de São Canuto foi aprovado por Leão
XIII, em 1882.
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