sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Querida Amazônia: Encontro intercultural - nºs 36 a 38


As culturas da Amazônia profunda, como aliás toda a realidade cultural, têm as suas limitações; as culturas urbanas do Ocidente também as têm. Fatores, como o consumismo, o individualismo, a discriminação, a desigualdade e muitos outros, constituem aspetos frágeis das culturas aparentemente mais evoluídas. As etnias que desenvolveram um tesouro cultural em conexão com a natureza, com forte sentido comunitário, apercebem-se facilmente das nossas sombras, que não reconhecemos no meio do suposto progresso. Assim, far-nos-á bem recolher a sua experiência da vida.

É a partir das nossas raízes que nos sentamos à mesa comum, lugar de diálogo e de esperanças compartilhadas. Deste modo a diferença, que pode ser uma bandeira ou uma fronteira, transforma-se numa ponte. A identidade e o diálogo não são inimigos. A própria identidade cultural aprofunda-se e enriquece-se no diálogo com os que são diferentes, e o modo autêntico de a conservar não é um isolamento que empobrece. Por isso, não é minha intenção propor um indigenismo completamente fechado, a-histórico, estático, que se negue a toda e qualquer forma de mestiçagem. Uma cultura pode tornar-se estéril, quando se fecha em si própria e procura perpetuar formas antiquadas de vida, recusando qualquer mudança e confronto com a verdade do homem. Isto poderia parecer pouco realista, já que não é fácil proteger-se da invasão cultural. Por isso, cuidar dos valores culturais dos grupos indígenas deveria ser interesse de todos, porque a sua riqueza é também a nossa. Se não progredirmos nesta direção de corresponsabilidade pela diversidade que embeleza a nossa humanidade, não se pode pretender que os grupos do interior da floresta se abram ingenuamente à civilização.

Na Amazônia, mesmo entre os distintos povos nativos, é possível desenvolver relações interculturais onde a diversidade não significa ameaça, não justifica hierarquias de um poder sobre os outros, mas sim diálogo a partir de visões culturais diferentes, de celebração, de inter-relacionamento e de reavivamento da esperança.


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