As culturas da Amazônia
profunda, como aliás toda a realidade cultural, têm as suas limitações; as
culturas urbanas do Ocidente também as têm. Fatores, como o consumismo, o
individualismo, a discriminação, a desigualdade e muitos outros, constituem
aspetos frágeis das culturas aparentemente mais evoluídas. As etnias que
desenvolveram um tesouro cultural em conexão com a natureza, com forte sentido
comunitário, apercebem-se facilmente das nossas sombras, que não reconhecemos
no meio do suposto progresso. Assim, far-nos-á bem recolher a sua experiência
da vida.
É a partir das nossas
raízes que nos sentamos à mesa comum, lugar de diálogo e de esperanças
compartilhadas. Deste modo a diferença, que pode ser uma bandeira ou uma
fronteira, transforma-se numa ponte. A identidade e o diálogo não são inimigos.
A própria identidade cultural aprofunda-se e enriquece-se no diálogo com os que
são diferentes, e o modo autêntico de a conservar não é um isolamento que
empobrece. Por isso, não é minha intenção propor um indigenismo completamente
fechado, a-histórico, estático, que se negue a toda e qualquer forma de
mestiçagem. Uma cultura pode tornar-se estéril, quando se fecha em si
própria e procura perpetuar formas antiquadas de vida, recusando qualquer
mudança e confronto com a verdade do homem. Isto poderia parecer pouco
realista, já que não é fácil proteger-se da invasão cultural. Por isso, cuidar
dos valores culturais dos grupos indígenas deveria ser interesse de todos,
porque a sua riqueza é também a nossa. Se não progredirmos nesta direção de
corresponsabilidade pela diversidade que embeleza a nossa humanidade, não se
pode pretender que os grupos do interior da floresta se abram ingenuamente à civilização.
Na Amazônia, mesmo
entre os distintos povos nativos, é possível desenvolver relações
interculturais onde a diversidade não significa ameaça, não justifica
hierarquias de um poder sobre os outros, mas sim diálogo a partir de visões
culturais diferentes, de celebração, de inter-relacionamento e de reavivamento
da esperança.
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