segunda-feira, 9 de julho de 2018

09 de julho - Santos Mártires Chineses



"Os preceitos do Senhor dão alegria". Estas palavras do Salmo responsorial refletem bem a experiência de Agostinho Zhao Rong e 119 Companheiros mártires na China. Os testemunhos que chegaram até nós deixam entrever neles um estado de espírito marcado por uma profunda serenidade e alegria.

Hoje a Igreja agradece ao seu Senhor, que a abençoa e a imbui de luz com o esplendor da santidade destes filhos e filhas da China. Não é porventura o Ano Santo o momento mais oportuno para fazer resplandecer o seu testemunho heroico? 
A jovem Ana Wang, com catorze anos, resiste às ameaças do carnífice que a convida a renegar e, dispondo-se à decapitação, declara com o rosto radiante: "A porta do Céu está aberta a todos" e murmura três vezes "Jesus". 

E Chi Zhuzi, com dezoito anos, grita destemido aos que acabavam de lhe cortar o braço direito e se preparavam para o esfolar vivo: "Cada pedaço da minha carne, cada gota do meu sangue vos repetirão que sou cristão".

Igual convicção e alegria testemunharam os outros 85 chineses, homens e mulheres de todas as idades e condições, sacerdotes, religiosos e leigos, que selaram a própria indefectível fidelidade a Cristo e à Igreja com o dom da vida. Isto aconteceu ao longo de vários séculos e em complexas e difíceis épocas da história da China. Esta celebração não é a ocasião oportuna para formular juízos sobre aqueles períodos históricos: poder-se-á e dever-se-á fazê-lo noutra circunstância. Com esta solene proclamação de santidade, a Igreja só deseja reconhecer que aqueles Mártires constituem um exemplo de coragem e de coerência para todos nós e honram o nobre povo chinês.

Nesta plêiade de Mártires resplandecem também 33 missionários e missionárias, que deixaram a sua terra e procuraram introduzir-se na realidade chinesa, assumindo com amor as suas características, no desejo de anunciar Cristo e de servir aquele povo. Os seus túmulos estão lá, como que a significar a sua definitiva pertença à China, que eles, apesar dos seus limites humanos, amaram com sinceridade, despendendo por ela as suas energias. "Nunca fizemos mal a ninguém responde Dom Francisco Fogolla ao governador que se prepara para o golpear com a espada. Ao contrário, fizemos o bem a muitos".

Papa João Paulo II – Homilia de Canonização – 01 de outubro de 2000

A Igreja universal ratifica a santidade destes 120 mártires, que em diversas épocas e lugares deram a vida por fidelidade a Cristo: 32 deles foram martirizados entre 1814 e 1862; 86 morreram durante a revolta dos Boxers em 1900 e dois foram mortos em 1930. Os mártires tinham entre sete e 79 anos

A perseguição religiosa na China ocorreu em diversos períodos da sua história. A primeira perseguição deu-se na dinastia Yuan (1281-1367). Prosseguiu mais tarde na dinastia Ming (1606-1907), recrudescendo de forma especial em 1900 com a revolta dos Boxers. E continuou durante as cinco décadas de governo sem interrupção. Grande parte destes canonizados deram a vida durante a revolta dos Boxers em 1900, que foi como que uma premonição do que iria acontecer nas cinco décadas de governo comunista na China.

Os missionários foram objeto de um édito imperial de 10 de Julho de 1900, que fomentou e provocou o massacre de milhares de cristãos. Outros morreram durante as perseguições religiosas das dinastias Ming (1368-1644) e Qing (1644-1911). De fora ficarão as centenas de mártires que durante o regime comunista foram perseguidos e deram a vida por fidelidade ao Evangelho e a Cristo. Para a Igreja da China é um acontecimento importante pela magnitude e pelo contexto em que ocorre. É-o igualmente para a Igreja universal, bastante desconhecedora do que acontece com a Igreja da China.

O martírio tem assinalado a Igreja da China ao longo dos séculos, desde a chegada da mensagem cristã no século VII com a vinda do monge sírio Alopen e dos nestorianos até Xian, capital da dinastia Tang, no ano de 635. Os estudiosos da Igreja na China, que falam de cinco tentativas de evangelização do país, concordam em afirmar que cada tentativa em estabelecer a presença do Evangelho no Império do Centro acarretou perseguições e martírio. Umas vezes pelas discrepâncias de credos, porque o imperador era considerado o Filho do Céu; outras pelos contrastes de culturas ou por motivos políticos; outras vezes por divisões entre as congregações religiosas presentes no território. O fato é que estamos diante de uma Igreja martirial. Mesmo hoje em dia isso é uma realidade permanente tanto para as comunidades subterrâneas como para as que conseguem atuar mais às claras.

O controlo e a perseguição variam conforme os lugares e as situações, mas os cristãos continuam a ser abertamente perseguidos e, por vezes, encarcerados e torturados. Como João Paulo II dizia na sua mensagem aos católicos da China por ocasião da celebração do ano jubilar: “O Jubileu será uma oportunidade para lembrar os trabalhos apostólicos, os sofrimentos, as dores e o derramamento de sangue que têm feito parte da peregrinação desta Igreja ao longo dos tempos. Também no meio de vós o sangue dos mártires se converteu em semente de uma multidão de autênticos discípulos de Jesus… E parece que este tempo de prova ainda prossegue nalgumas localidades.”

Com esta canonização, a Igreja da China envia uma mensagem profética ao mundo de hoje. Tanto pela singeleza com que afirmaram a sua fé como pela valentia em recusar a apostasia que os libertaria dos tormentos, da tortura e das infindáveis humilhações, o testemunho destes 120 mártires é a palavra viva de Deus, clara e ao mesmo tempo misteriosa. É sem dúvida alguma um encorajamento para as gerações vindouras de cristãos. Para além deste grupo de cristãos, muitos mais haveria a canonizar, mas, por falta de provas e informação, não puderam ser reconhecidos, embora a Igreja autentique como valores de ontem e de hoje a fidelidade a Cristo acima de qualquer ideologia, sistema ou tirania.
Os santos chineses espelham uma capacidade de doação e uma confiança ilimitada em Deus num contexto hostil à mensagem cristã. Se o autêntico tesouro do discípulo de Cristo é a cruz e se não há outra forma de seguimento de Cristo senão através da cruz, podemos dizer que a Igreja universal reconhece de forma pública o testemunho destes mártires como riqueza para toda a Igreja.

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