Hoje será beatificado em Três Pontas, MG, o Padre Victor. Muitos ainda não conhecem sua bela história, por isso vamos apresentar alguns detalhes da sua vida.
Francisco de Paula Victor nasceu em Campanha, MG em 1827, filho de uma escrava, Lourença Maria de Jesus, sobre o seu pai, não temos informação, era possivelmente um escravo também.
É importante apresentar essa informação, porque pela legislação da época, os filhos ilegítimos, bem como os escravos, negro ou mulato, não poderiam receber as Ordens sacras.
Assim, Victor cresceu como escravo. No entanto, sua “proprietária” e madrinha, Dona Mariana, vendo sua inteligência e bondade, providenciou para que ele estudasse e aprendesse a ofício de alfaiate.
Desde cedo Victor ouviu o chamado de Deus ao sacerdócio, mas sabendo das dificuldades, guardava no seu coração esse segredo. No dia que partilhou com seu mestre alfaiate seus sonhos, foi profundamente humilhado e espancado:
“- Não se esqueça de que um é escravo, é escravo, e basta! Não tem nenhum direito!... Entre as palavras que você pode dizer não está o verbo ‘quero’! Quem é escravo deve fazer somente a vontade de seu dono. Lembre-se, rapaz! No dia em que você for padre, às minhas galinhas terão dentes.”
Mas os caminhos de Deus são maravilhosos! Dona Mariana ao saber da sua vocação, o apoia, conversa com o Padre Antônio e depois com o Bispo, Dom Viçoso e juntos decidem enfrentar todas as dificuldades e impedimentos. Victor é advertido pelo bispo::
“- Percebe quantos obstáculos legais existem? Dizem sem meios-termos que não pode tornar-se sacerdote. Me atam as mãos. Não são pedras, são montanhas! Mas as montanhas podem ser superadas, ou não?
Victor, o que me importa saber sobre você é outra coisa: está disposto a ser humilhado, a ser desprezado pó muitos? A sua vida será sempre coberta de espinhos que o farão sangrar, mas recorde-se, quanto maiores as adversidades e os sofrimentos, tanto mais compreenderá que Jesus Cristo ama você é, por isso, está colocando-o à prova.”
Diante da reposta firme e positiva de Victor, as coisas começam a acontecer.
Aos 22 anos ele chega a Mariana, no seminário, onde apresentou sua carta de alforria e o consentimento de Dona Mariana para que seguisse o caminho do sacerdócio.
No seminário é admitido na turma do terceiro ano devido aos seus conhecimentos de latim e pelos seus estudos já completados. Começa então um período de grande sofrimento e provações. Não sendo aceito pelos colegas, que o tratavam como escravo, o ofendendo e obrigando a fazer inúmeras tarefas.
E Victor? Apenas rezava, rezava e, algumas vezes, à noite, chorava em silêncio e lembrava as palavras de Dom Viçoso sobre as dificuldades que enfrentaria.
Um dia numa visita pastoral, Dom Viçoso prega aos seminaristas sobre a Carta de São Paulo aos Corintos: “Como o corpo é um, embora tenha muitos membros, e como todos os membros do corpo, embora sejam muitos, formam um só corpo, assim também acontece com Cristo. De fato, todos nós, judeus ou gregos, escravos ou livres,momos batizados num só Espírito, para formarmos um só corpo...”
Encerrando a leitura ele disse: “- Gostaria que hoje meditassem sobre esta palavra. Todos nós... Todos... Somos corpo de Cristo... E todos nós... Todos... Somos seus membro. Quem tem ouvidos para entender, entenda.”
A partir daí alguns seminaristas assumiram um comportamento diferente entre eles e em particular, no relacionamento com Victor.
Mais uma vez Dom Viçoso pregou: “Vocês se tornarão sacerdotes para servir, não para serem servidos.”
E assim, o tempo, a paciência, e, sobretudo, o exemplo de Victor fizeram com que seus companheiros passassem a aceitá-lo, respeitá-lo e admira-lo.
Vencendo as dificuldades a cada dia, com a ajuda da Madrinha Mariana e do Bispo Dom Viçoso na resolução das questões legais, no dia 15 de março de 1851, Victor recebe o diaconato e no dia 14 de junho do mesmo ano, é ordenado sacerdote! O sonho de Victor havia se tornado realidade.
A vida de Padre Victor foi cheia de dificuldades, muito preconceito mas a graça de Deus o acompanhava e pouco a pouco ele vai conquistando a confiança, o respeito e amor dos paroquianos. Em Três Pontas, permaneceu como vigário durante 53 anos.
Apóstolo da Caridade, foi um pároco generoso e dinâmico. Garantia sempre a santa missa, celebrada no domingo com grande solenidade e com a participação de pregadores conhecidos. Era muito ativo na catequese e na administração dos sacramentos. Introduziu o mês em homenagem a Nossa Senhora e percorria a cavalo as áreas rurais para levar conforto espiritual aos mais distantes. De 1852 a 1905, ano de sua morte, batizou 8.790 recém-nascidos filhos de brancos e 383 filhos de escravos. Incentivou a educação dos jovens, especialmente os pobres. Por isso, fundou em sua paróquia uma escola gratuita. Dava aos pobres as ofertas que recebia. Beneficiava também aqueles que no início o desprezaram. Os seus paroquianos, cerca de vinte anos depois de sua morte, colocaram uma placa em sua homenagem com a inscrição: “A sua vida foi um Evangelho”.
Só para ilustrar sua vida de doação total, contamos essa passagem de sua vida:
Uma manhã ao sair de casa, sua empregada comunicou que não havia café, açúcar e outros alimentos que haviam acabado. Padre Victor respondeu sorrindo que não tinha dinheiro. Durante o dia recebeu uma oferta num envelope fechado que não abriu. Quando uma paroquiana pede ajuda para comprar remédios para o filho doente, ele não hesita em entregar-lhe o envelope fechado. Ela vai a farmácia e retorna com o troco. Ele não aceita o dinheiro e manda que ela compre alimentos para a família.
Retornando para casa avisa a empregada: “Saí sem dinheiro e retorno sem dinheiro...quem sabe algum dia teremos um pouco para o café e o açúcar.”
Padre Victor morreu em 23 de setembro de 1905, aos 78 anos. Durante três dias seu corpo ficou exposto, porque não acabava a fila dos fiéis que queria se despedir dele.
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