O
Padre da Igreja ao qual hoje dedicamos a nossa atenção é São Paulino de Nola.
Contemporâneo de Santo Agostinho, ao qual foi ligado por uma profunda amizade,
Paulino exerceu o seu ministério na Campânia, em Nola, onde foi monge, depois
presbítero e Bispo. Era originário de Aquitânia, no sul da França, na cidade de
Bordéus, onde nasceu de uma família influente. Recebeu uma requintada educação
literária.
Afastou-se
da sua terra pela primeira vez para seguir a sua precoce carreira política,
desempenhando, ainda jovem, o papel de governador da Campânia. Neste cargo
público foram admiradas as suas capacidades de sabedoria e de mansidão. Neste
período a graça fez germinar no seu coração a semente da conversão. O estímulo
veio da fé simples e intensa com que o povo honrava o túmulo de um Santo, o
mártir Félix, no Santuário de Cimitile. Como responsável da vida pública,
Paulino interessou-se por este Santuário e fez construir um hospício para os pobres
e uma estrada para facilitar o acesso aos numerosos peregrinos.
No
seu empenho por edificar a cidade terrena, ele ia descobrindo o caminho rumo à
cidade celeste. O encontro com Cristo foi o ponto de chegada de um caminho
trabalhoso, cheio de provas. Quando chegou à fé escreveu: "O homem sem Cristo é pó e sombra”.
Desejoso
de esclarecer o sentido da existência, foi a Milão para se colocar na escola de
Ambrósio. Completou depois a formação cristã na sua terra natal, onde recebeu o
batismo. Encontra-se no seu percurso de fé também o matrimonio. De fato, casou
com Terásia, uma mulher piedosa de Barcelona, e teve um filho. Teria continuado
a viver como bom leigo cristão, se a morte do filho depois de alguns dias do
nascimento o não tivesse abalado, mostrando-lhe que era outro o desígnio de
Deus para a sua vida. De fato, sentiu-se chamado a devotar-se a Cristo numa
vida ascética rigorosa.
Em
total acordo com a esposa Terásia, vendeu os seus bens em benefício dos pobres
e, juntamente com ela, deixou Aquitânia indo para Nola, onde os dois habitaram
ao lado da Basílica do protetor São Félix, vivendo em casta fraternidade,
segundo uma forma de vida à qual outros se uniram. O ritmo comunitário era
tipicamente monástico, mas Paulino, que em Barcelona tinha sido ordenado presbítero,
começou a ocupar-se também do ministério sacerdotal em favor dos peregrinos.
Isto proporcionou-lhe a simpatia e a confiança da comunidade cristã que, com a
morte do Bispo, por volta de 409, o quis escolher como sucessor na cátedra de
Nola.
A
sua ação pastoral intensificou-se, caracterizando-se por uma atenção particular
pelos pobres. Deixou a imagem de um autêntico Pastor da caridade, como o
descreveu São Gregório Magno: Paulino é esculpido no gesto heroico de se
oferecer prisioneiro no lugar do filho de uma viúva. O episódio é
historicamente discutível, mas permanece a figura de um Bispo de grande
coração, que soube estar próximo do seu povo nas tristes situações das invasões
bárbaras.
A
conversão de Paulino impressionou os contemporâneos. O seu mestre Ausónio, um
poeta pagão, sentiu-se "traído", e dirigiu-lhe palavras ásperas,
reprovando-lhe por um lado o "desprezo", julgado desatinado, dos bens
materiais, e por outro o abandono da vocação de literato. Paulino retorquiu que o seu doar aos pobres não significa desprezo
pelos bens terrenos, mas ao contrário uma sua valorização para a finalidade
mais nobre da caridade. Quanto aos compromissos literários, aquilo que
Paulino tinha abandonado não era o talento poético, que teria continuado a
cultivar, mas as fórmulas poéticas inspiradas na mitologia e nos ideais pagãos.
Uma nova estética governa a sua
sensibilidade: era a beleza do Deus encarnado, crucificado e ressuscitado, do
qual ele se fazia agora cantor. Na realidade, não tinha deixado a poesia,
mas tirava do Evangelho a sua inspiração como diz neste verso: "Para mim a única arte é a fé, e Cristo a
minha poesia".
Os
seus poemas são cânticos de fé e de amor, nos quais a história quotidiana dos
pequenos e grandes acontecimentos é vista como história de salvação, como
história de Deus conosco. Muitas destas composições estão ligadas à festa do mártir Félix,
que ele tinha eleito como celeste Padroeiro. Recordando São Félix, ele
pretendia glorificar Cristo, estando convencido de que a intercessão do Santo
lhe tivesse obtido a graça da conversão: "Na tua luz, jubiloso, amei Cristo".
No
ascetismo de Cimitile a vida transcorria na pobreza, na oração e totalmente
imersa na "lectio
divina". A Escritura lida, meditada, assimilada, era a luz sob cujo
raio o Santo de Nola perscrutava a sua alma na propensão para a perfeição. A
quem permanecia admirado pela decisão por ele tomada de abandonar os bens
materiais, recordava que este gesto estava muito longe de representar já a
plena conversão: "O abandono ou a
venda dos bens temporais possuídos neste mundo não constitui o cumprimento, mas
apenas o início da corrida no estádio; não é, por assim dizer, a meta, mas só a
partida. De fato, o atleta não vence quando se despe, porque depõe as suas
vestes apenas para começar a lutar, mas é digno de ser coroado vencedor só
depois de ter combatido devidamente".
Ao lado da ascese e da Palavra de Deus, a caridade: na comunidade
monástica os pobres sentiam-se em casa. A eles Paulino não se limitava a dar
esmola: acolhia-os como se fossem o próprio Cristo.
Tinha reservado para eles uma parte do mosteiro e, fazendo assim, parecia-lhe
não que dava, mas que recebia, no intercâmbio de dons entre o acolhimento
oferecido e a gratidão orante dos assistidos. Chamava aos pobres seus
"padroeiros" e, observando que estavam alojados no andar inferior,
gostava de dizer que a sua oração servia de fundamento para a sua casa.
São
Paulino não escreveu tratados de teologia, mas os seus poemas e o denso
epistolário são ricos de uma teologia vivida, embebida da palavra de Deus,
constantemente perscrutada como luz para a vida.
Em
particular, sobressai o sentido da Igreja como mistério de unidade. A comunhão
era por ele vivida sobretudo através de uma marcada prática da amizade
espiritual. Nela Paulino foi um verdadeiro mestre, fazendo da sua vida uma
encruzilhada de espíritos eleitos: de Martinho de Tours a Jerônimo, de Ambrósio
a Agostinho, de Delfim de Bordéus a Nicetas de Remesiana, de Vitrício de Ruão a
Rufino de Aquileia, de Pamáquio a Suplício Severo, e muitos outros ainda, mais
ou menos conhecidos. Neste clima surgem as intensas páginas escritas por
Agostinho. Além dos conteúdos de cada uma das cartas, impressiona a afabilidade
com que o Santo de Nola canta a própria amizade, como manifestação do único
corpo de Cristo animado pelo Espírito Santo. Eis um trecho significativo, no
início da correspondência entre os dois amigos:
"Não devemos admirar-nos se,
embora distantes, estamos presentes um para o outro e sem nos termos conhecido
conhecemo-nos, porque somos membros de um só corpo, temos uma só cabeça, somos
inundados por uma só graça, vivemos de um só pão, percorremos o mesmo caminho,
habitamos na mesma casa”.
Como
se vê, uma lindíssima descrição do que significa ser cristão, ser Corpo de
Cristo, viver na comunhão da Igreja. A teologia do nosso tempo encontrou
precisamente no conceito de comunhão a chave de abordagem do mistério da
Igreja. O testemunho de São Paulino de Nola ajuda-nos a sentir a Igreja, como
no-la apresenta o Concílio Vaticano II, como sacramento da união íntima com
Deus e assim da unidade de todos nós e por fim de todo o gênero humano.
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