É urgente voltar à normalidade da vida cristã com a presença física na Missa, nos locais onde as circunstâncias o permitirem: nenhuma transmissão é equiparável à participação pessoal ou pode substitui-la.
A
pandemia devido ao coronavírus produziu transtornos não somente na
dinâmica social e familiar, mas também na vida da comunidade cristã, incluída a
dimensão litúrgica.
A
dimensão comunitária tem um sentido teológico: Deus é a relação de Pessoas na
Santíssima Trindade e se coloca em relação com o homem e a mulher e os chama
por sua vez a uma relação com Ele.
Assim,
enquanto os pagãos construíam templos dedicados apenas à divindade, aos quais
as pessoas não tinham acesso, os cristãos, assim que passaram a usufruir da
liberdade de culto, imediatamente construíam lugares que fossem domus
Dei et domus ecclesiae, onde os fiéis podiam reconhecer-se como comunidade
de Deus. Por isso a casa do Senhor supõe a presença da família dos filhos de
Deus.
A
comunidade cristã nunca buscou o isolamento e nunca fez da igreja uma cidade de
portas fechadas. Formados para o valor da vida comunitária e a busca do bem
comum, os cristãos sempre buscaram a inserção na sociedade. Mesmo na emergência
da pandemia, surgiu um grande sentido de responsabilidade: na escuta e
colaboração com as autoridades civis e com os especialistas, os Bispos estiveram
prontos a tomar decisões difíceis e dolorosas, até a prolongada suspensão da
participação dos fiéis na celebração da Eucaristia.
Assim
que as circunstâncias o permitirem é necessário e urgente regressar à
normalidade da vida cristã, que tem o edifício da Igreja como casa e a
celebração da liturgia, em particular a Eucaristia, como meta para a qual se
encaminha a ação da Igreja e a fonte de onde promana toda a sua força (Sacrosanctum
Concilium, 10).
Conscientes
de que Deus nunca abandona a humanidade que criou, e que mesmo as mais duras
provas podem dar frutos de graça, aceitamos a distância do altar do Senhor como
um tempo de jejum eucarístico, útil para redescobrir a importância vital, a
beleza e a preciosidade incomensurável. No entanto, assim que possível, é
necessário voltar à Eucaristia com um crescente desejo de encontrar o Senhor,
de estar com Ele, de recebê-lo para levá-lo aos irmãos com o testemunho de uma
vida cheia de fé, de amor e de esperança.
Embora
os meios de comunicação desenvolvam um apreciado serviço aos doentes e àqueles
impossibilitados de ir à igreja, e tenham prestado um grande serviço na
transmissão da Santa Missa num momento em que não havia possibilidade de
celebrar comunitariamente, nenhuma transmissão é equiparável à participação
pessoal ou pode substitui-la.
Com
efeito, estas transmissões, por si só, correm o risco de nos afastar de um
encontro pessoal e íntimo com o Deus encarnado que se entregou a nós não de
forma virtual, mas sim, dizendo: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue
permanece em mim e eu nele” (Jo 6,56). Esse contato físico com o Senhor é
vital, indispensável, insubstituível. Uma vez identificadas e adotadas as
medidas concretamente praticáveis para reduzir ao mínimo o contágio do vírus,
é necessário que todos retomem seu lugar na assembleia dos irmãos, encorajando
os desanimados, amedrontados, há muito tempo ausentes ou distraídos.
A
devida atenção às normas de higiene e segurança não pode levar à esterilização
de gestos e ritos. Ademais, confia-se na ação prudente, mas firme dos Bispos,
para que a participação dos fiéis na celebração da Eucaristia não seja reduzida
pelas autoridades públicas a uma 'aglomeração', e não seja considerada como
equiparável ou até mesmo subordinada às formas de agregação recreativa. As
normas litúrgicas não são matéria sobre os quais as autoridades civis podem
legislar, mas apenas as autoridades eclesiásticas competentes (cf. Sacrosanctum
Concilium, 22).
Devemos
facilitar a participação dos fiéis nas celebrações, mas sem experiências
rituais improvisadas e em total conformidade com as normas contidas nos livros
litúrgicos que regulam seu desenvolvimento, e reconhecendo aos fiéis o direito
de receber o Corpo de Cristo e adorar o Senhor presente na Eucaristia nas
formas previstas, sem limitações que até mesmo possam ir além do previsto pelas
normas higiênicas emanadas pelas autoridades públicas ou pelos Bispos.
Um
princípio seguro para não errar é a obediência. Obediência às normas da Igreja,
obediência aos Bispos. Em tempos de dificuldade (por exemplo, pensemos nas
guerras, pandemias), os Bispos e as Conferências Episcopais podem dar
normativas provisórias que devem ser obedecidas. A obediência salvaguarda o
tesouro confiado à Igreja. Estas medidas ditadas pelos Bispos e pelas
Conferências Episcopais expiram quando a situação volta à normalidade.
A
Igreja protege a pessoa humana na sua totalidade e à necessária preocupação pela
saúde pública, a Igreja une o anúncio e o acompanhamento para a salvação eterna
das almas.
Cardeal Roberth Sarah - 3 de setembro de 2020
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