Nºs 179 a 186
Já me aconteceu ver
árvores jovens, belas, que elevavam seus ramos sempre mais alto para o céu;
pareciam uma canção de esperança. Mais tarde, depois duma tempestade,
encontrei-as caídas, sem vida. Estenderam os seus ramos sem se enraizar bem na
terra e, por ter poucas raízes, sucumbiram aos assaltos da natureza. Por isso, custa-me ver que alguns propõem
aos jovens construir um futuro sem raízes, como se o mundo começasse agora.
Com efeito, é impossível uma pessoa crescer, se não possui raízes fortes que a
ajudem a estar firme de pé e agarrada à terra. É fácil extraviar-se, quando não
temos onde agarrar-nos, onde firmar-se.
Pensai bem! Se uma pessoa vos fizer uma proposta
dizendo para ignorardes a história, não aproveitardes da experiência dos mais
velhos, desprezardes todo o passado olhando apenas para o futuro que essa
pessoa vos oferece, não será uma forma fácil de vos atrair para a sua proposta
a fim de fazerdes apenas o que ela diz?
Aquela pessoa precisa
de vós vazios, desenraizados, desconfiados de tudo, para vos fiardes apenas nas
suas promessas e vos submeterdes aos seus planos. Assim procedem as ideologias
de variadas cores, que destroem (ou desconstroem) tudo o que for diferente,
podendo assim reinar sem oposições. Para isso, precisam de jovens que desprezem
a história, rejeitem a riqueza espiritual e humana que se foi transmitindo
através das gerações, ignorem tudo quanto os precedeu.
Ao mesmo tempo, os manipuladores servem-se doutro recurso:
uma adoração da juventude, como se tudo o que não é jovem aparecesse detestável
e caduco. O corpo jovem torna-se o símbolo deste novo
culto e, consequentemente, tudo o que tenha a ver com este corpo é idolatrado e
desejado sem limites, enquanto o que não for jovem é olhado com desprezo. Mas é
uma arma que acaba por degradar os jovens, esvaziando-os de valores reais e
utilizando-os para obter benefícios individuais, econômicos ou políticos.
Queridos jovens, não permitais que usem a vossa juventude
para promover uma vida superficial, que confunde beleza com aparência.
Sabei, antes,
descobrir que há beleza no trabalhador que regressa a casa surrado e
desalinhado, mas com a alegria de ter ganho o pão para os seus filhos.
Há uma beleza
estupenda na comunhão da família reunida ao redor da mesa e no pão partilhado
com generosidade, ainda que a mesa seja muito pobre.
Há beleza na esposa
mal penteada e já um pouco idosa, que continua a cuidar do seu marido doente,
para além das suas forças e da própria saúde. Embora já esteja distante a lua
de mel, há beleza na fidelidade dos casais que se amam no outono da vida,
naqueles velhinhos que caminham de mãos dadas.
Há beleza, para além
da aparência ou da estética imposta pela moda, em cada homem e cada mulher que
vive com amor a sua vocação pessoal, no serviço desinteressado à comunidade, à
pátria, no trabalho generoso a bem da felicidade da família, comprometidos no
árduo trabalho, anónimo e gratuito, de restabelecer a amizade social.
Descobrir, mostrar e realçar esta beleza, que lembra a de
Cristo na cruz, é colocar as bases da verdadeira solidariedade social e da
cultura do encontro.
Atualmente, a par das estratégias do falso culto da
juventude e da aparência, promovem-se uma espiritualidade sem Deus, uma
afetividade sem comunidade nem compromisso com os que sofrem, o medo dos pobres
vistos como sujeitos perigosos, e uma série de ofertas que pretendem fazer-vos
acreditar num futuro paradisíaco que sempre será adiado para mais tarde.
Não é isto que vos
quero propor; e, com todo o afeto que vos tenho, quero advertir-vos para não
vos deixardes dominar por esta ideologia que, em vez de vos tornar mais jovens,
transformar-vos-á em escravos. Proponho-vos outro caminho, feito de liberdade,
entusiasmo, criatividade, horizontes novos, mas cultivando ao mesmo tempo as
raízes que nutrem e sustentam.
Nesta linha – quero
salientá-lo –, muitos Padres Sinodais, vindos de contextos não ocidentais,
assinalam como a globalização seja portadora, nos seus países, de autênticas
formas de colonização cultural, que desenraízam os jovens das origens culturais
e religiosas donde provêm. Torna-se necessário um esforço da Igreja para os
acompanhar nesta passagem, a fim de não perderem os traços mais preciosos da
sua identidade
Vemos hoje uma
tendência para homogeneizar os
jovens, dissolver as diferenças próprias do seu lugar de origem, transformá-los
em sujeitos manipuláveis feitos em série. Deste modo, causa-se uma destruição
cultural, que é tão grave como a extinção das espécies animais e vegetais. Por
isso, numa mensagem aos jovens indígenas reunidos no Panamá, exortava-os: Assumi as vossas raízes! Mas não vos
limiteis a isto. A partir destas raízes, crescei, florescei, frutificai.