quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Mês Missionário Extraordinário: 23 de outubro - Beato Lucien Botovasoa


Lucien Botovasoa nasceu no ano de 1908 em Madagascar. Os seus pais eram camponeses pobres, como tantos outros da região, sempre dependentes dos riscos associados ao clima. Seguiam a religião tradicional, mas tinham uma mentalidade aberta. Quando os habitantes da aldeia descobriram a fé cristã, muitos deles converteram-se e pediram o Batismo. Entre estes contava-se também Lucien Botovasoa, batizado a 15 de abril de 1922, Sábado Santo, com treze anos de idade, antes dos seus pais, que se converteram à fé cristã muito mais tarde.

Lucien Botovasoa foi crismado no ano seguinte, a 2 de abril de 1923. Desde a sua infância, Lucien desejava viver a sua fé com empenho e seriedade. O ideal de vida de Lucien era ser um bom cristão, apóstolo de Jesus no coração do mundo. Aquilo que mais caracterizou o martírio de Lucien foi o amor pelos seus compatriotas e pelos seus perseguidores. Não foi por acaso que recebeu o cognome de Rabefihavanana, o Reconciliador.  

Seguia o lema dos padres jesuítas, Ad majorem Dei gloriam, e tendo obtido o diploma do magistério, que lhe permitiria ensinar, regressou a Vohipeno como vice-diretor da escola paroquial e professor.
Era um pedagogo maravilhoso e um professor excepcional, competente, consciencioso e cheio de zelo na forma de explicar aos seus alunos, com clareza e doçura, todas as matérias escolares. No entanto, também era um mestre cristão, preocupando-se sempre com a educação religiosa das crianças, às quais ensinava o catecismo quer nas horas escolares quer depois das aulas.
Todas as tardes, depois da escola, lia as histórias dos santos àqueles que o desejavam. Aquilo de que mais gostava era das vidas dos mártires: sabia contá-las a quem o escutava com um fervor muito particular, que inflamava os corações.

Em 10 de outubro de 1930, Lucien casa-se pela Igreja com Suzanne Soazana. Tiveram oito filhos, dos quais apenas cinco sobreviveram. Lucien amava os seus filhos, educava-os e ensinava-os a rezar. No entanto, também dedicava imenso tempo aos filhos dos outros, visitando os doentes, dando aulas à noite e animando vários grupos aos quais dava catequese: os Cruzados do Coração de Jesus, em que ingressara, a Guarda de Honra do Sagrado Coração de Jesus e os Jovens Católicos Malgaxes.

Suzanne gostaria que o marido trocasse o ofício de professor pelo de contabilista. Lucien, porém, continuava o seu serviço de formação na vida cristã com alegria e generosidade. O lugar em que o viam com mais frequência era a igreja: Lucien tocava acordeão e dirigia o coro, não só durante a missa dominical, mas também diariamente, na missa das seis da manhã.

Por volta de 1940, procurando um livro sobre a vida de um santo casado que lhe servisse de modelo, Lucien Botovasoa descobriu a Ordem Terceira Franciscana (a partir de 1978, Ordem Franciscana Secular), e estudou a sua Regra. Com Marguerite Kembarakala, que o tinha formado na fé, constituiu uma primeira comunidade de irmãos em Vohipeno. A regra era muito exigente, e Lucien aplicava-a à letra.

Lucien Botovasoa começou a destacar-se pela sua piedade e pobreza. Levantava-se várias vezes durante a noite, rezando de joelhos aos pés da cama; depois, às seis da manhã, dirigia-se à igreja para fazer uma hora de meditação diante do sacrário. Às quartas e sextas-feiras animava a refeição em família, mas, fiel à Regra, jejuava, para desagrado de Suzanne. Em outubro de 1945 e em junho de 1946, houve eleições políticas em Madagáscar. Os dois partidos políticos desejavam ter Lucien Botovasoa como seu candidato. Lucien, porém, recusou categoricamente o convite de ambos, denunciando que “a vossa política alimenta-se de mentiras e só poderá acabar em sangue”.

No dia 30 de março de 1947, Domingo de Ramos, enquanto Lucien participava na Santa Missa, teve de seguir o seu irmão até à floresta, por ordem do seu pai. Os dois refugiaram-se ali quando os insurgentes atacaram a cidade. Os combates duraram até quarta-feira. As matanças às mãos do Partido dos Deserdados de Madagascar mancharam de sangue a Semana Santa. O resultado foi um massacre total, com dezoito igrejas e cinco escolas incendiadas.

Naturalmente, no dia de Páscoa não foi possível celebrar a Eucaristia na igreja paroquial. No segundo domingo da Páscoa, Lucien regressou à cidade depois de ter levado a sua família para um lugar seguro, na floresta. Aí conseguiu reunir os refugiados numa oração comum, na qual participaram católicos, protestantes e muçulmanos. Lucien comentou o Evangelho, exortando todos a reanimar a sua própria fé e a ter coragem para enfrentar o martírio, caso tal fosse necessário. Falava e conduzia os cânticos com uma alegria intensa e um grande júbilo.

A 16 de abril de 1947, o rei Tsimihono, responsável local do Movimento Democrático da Renovação Malgaxe (MDRM), convocou toda a gente com o intuito de expulsar da cidade os inimigos do partido, incluindo Lucien Botovasoa. Na quinta-feira, 17 de abril, o rei propôs um posto muito importante a Lucien Botovasoa: pediu-lhe que se tornasse secretário do MDRM, mas ele recusou. Entretanto, Lucien tinha comunicado à mulher que ia ser condenado. Suzanne desejaria que ele se escondesse, mas Lucien recusou e, tirando da parede uma imagem de São Francisco, disse: Será este o meu guia.

Após um almoço sereno, em família, e depois da oração, Lucien respondeu sem a mínima hesitação àqueles que tinham vindo para prendê-lo: Estou pronto.
Entregou-se sem a menor resistência. Sabia que ia ser morto e, quando o chamaram, avançou. Sentado à direita do rei, no lugar de honra, disse em voz alta:
Sei que estais prestes a matar-me e não me posso opor. Se a minha vida pode salvar outras, não hesiteis em matar-me. A única coisa que vos peço é que não toqueis nos meus irmãos.

Se tivesse aceitado o cargo de secretário do MDRM, teria salvado a sua vida. No entanto, respondia: Vós matais, queimais as igrejas, proibis a oração, mandais espezinhar os crucifixos e destruir as imagens sagradas, os rosários e os escapulários, quereis profanar a nossa igreja, transformando-a num salão de baile, fazeis um trabalho sujo. Sabeis como a religião é importante para mim: não posso trabalhar para vós.

Uns trinta rapazes de Ambohimanarivo, a maior parte seus antigos alunos, acompanharam-no até ao Matadouro, local onde tinham lugar as execuções, na saída sul da cidade, numa localidade chamada Ambalafary.
Lucien pedia: Dizei à minha família que não chore porque eu estou feliz. É Deus que me leva consigo. Que os vossos corações nunca abandonem o Senhor!

Caminhava como um homem livre, como um vencedor. O grupo dos rapazes chegou ao lugar da execução. Três homens designados pelo rei já estavam no seu posto. Para lá chegar, o cortejo tinha de atravessar um canal. Antes de o atravessar, Lucien pediu que o deixassem rezar, o que lhe foi concedido.
Ó meu Deus, perdoa aos meus irmãos, que agora têm uma difícil missão a cumprir. Possa o meu sangue ser derramado para salvação da minha pátria!

Lucien repetiu várias vezes estas palavras. Também rezou em latim, e talvez tenha entoado o cântico quaresmal de que tanto gostava: Poupa, Senhor, poupa o teu povo, faz com que a tua cólera não permaneça para sempre sobre nós!
Em seguida quiseram ligar-lhe as mãos, mas ele recusou. Não me ligueis para me matar. Eu ligo-me sozinho.

Cruzou os pulsos um sobre o outro, segurando na mão a cruz do rosário que tinha ao pescoço. Já de joelhos, rezou mais uma vez, repetindo as palavras que já dissera antes: Ó meu Deus, perdoa aos meus irmãos…

Era o primeiro a perdoar aos verdugos, intercedendo por eles, enquanto estes escarneciam dele: A tua oração é demasiado longa! Acreditas que te salvará? e alguns deles, que tinham ficado na outra margem do canal, insultavam-no aos gritos. Lucien, porém, respondia:
Ainda não acabei! Deixai-me mais um momento.

Ergueu as mãos ao céu e prostrou-se três vezes por terra, como Jesus durante a Paixão, depois voltou-se para eles, dizendo: Apressai-vos agora, porque o espírito está pronto, mas a carne é fraca. Enquanto o matavam, os verdugos zombavam da sua vítima: Agora vai tocar o teu acordeão.
Tendo expirado por amor a Cristo e à sua Igreja, o seu corpo foi lançado ao rio Matitanana. Reconhecendo o seu martírio e o testemunho da sua fé, a Igreja beatificou-o a 15 de abril de 2018, em Vohipeno, no Madagascar.

Sua memória é celebrada pela Igreja no dia 17 de abril.

Nenhum comentário:

Postar um comentário