A partir de amanhã à tarde, com a Missa in
Coena Domini, os solenes ritos litúrgicos vão nos ajudar a meditar de
modo mais vivo a paixão, a morte e a ressurreição do Senhor nos dias do Santo
Tríduo pascal, centro de todo o ano litúrgico.
Que a graça divina abra os nossos corações à
compreensão do dom inestimável que é a salvação que nos foi obtida pelo
sacrifício de Cristo. Como é maravilhoso, e ao mesmo tempo surpreendente, este
mistério! Nunca podemos meditar suficientemente esta realidade. Jesus, mesmo
sendo Deus, não quis fazer das suas prerrogativas divinas uma posse exclusiva;
não quis usar o seu ser Deus, a sua dignidade gloriosa e o seu poder, como
instrumento de triunfo e sinal de distância de nós. Ao contrário,
"despojou-se a si mesmo" assumindo a miséria e a frágil condição
humana. A forma divina escondeu-se em Cristo sob a forma humana, ou seja, sob a
nossa realidade marcada pelo sofrimento, pela pobreza, pelos nossos limites
humanos e pela morte.
Prelúdio do Tríduo pascal é a solene Missa
Crismal, que o Bispo celebra de manhã com o próprio presbitério, e
durante a qual juntos se renovam as promessas sacerdotais pronunciadas no dia
da Ordenação. É um gesto de grande valor, uma ocasião propícia como nunca na
qual os sacerdotes reafirmam a própria fidelidade a Cristo que os escolheu como
seus ministros.
Na Missa da tarde, chamada in Coena Domini, a
Igreja comemora a instituição da Eucaristia, o Sacerdócio ministerial e o
Mandamento novo da caridade, deixado por Jesus aos seus discípulos.
"Isto é o Meu corpo, que será
entregue por vós; fazei isto em Minha memória". Do mesmo modo, depois
da ceia, tomou também o cálice, dizendo: "Este Cálice é a Nova
Aliança no Meu Sangue; todas as vezes que o beberdes, fazei-o em Minha
memória".
Palavras cheias de mistério, que manifestam com
clareza o valor de Cristo: sob as espécies do pão e do vinho Ele torna-se
presente com o seu corpo entregue e com o seu sangue derramado. É o sacrifício
da nova e definitiva aliança oferecida a todos, sem distinção de raça nem de
cultura. E deste rito sacramental, que entrega à Igreja como prova suprema do
seu amor, Jesus constitui ministros os seus discípulos e quantos prosseguem o
seu ministério no decorrer dos séculos. A Quinta-Feira Santa constitui, portanto,
um convite renovado a dar graças a Deus pelo dom extremo da Eucaristia, que
deve ser acolhida com devoção e adorada com fé viva. Por isso, a Igreja
encoraja, depois da celebração da Santa Missa, a vigiar na presença do
Santíssimo Sacramento, recordando a hora triste que Jesus passou em solidão e
oração no Getsémani, antes de ser preso para ser depois condenado à morte.
E assim chegamos à Sexta-Feira Santa,
dia da paixão e da crucifixão do Senhor. Todos os anos, estando em silêncio
diante de Jesus pregado no madeiro da cruz, sentimos quanto são cheias de amor
as palavras por Ele pronunciadas na vigília, durante a Última Ceia. "Isto
é o Meu sangue, sangue da aliança, que vai ser derramado por muitos". Jesus
quis oferecer a sua vida em sacrifício pela remissão dos pecados da humanidade.
Como diante da Eucaristia, assim diante da paixão e morte de Jesus na Cruz o
mistério torna-se insondável para a razão. Somos postos diante de algo que
humanamente poderia parecer surdo: um Deus que não só se faz homem, com todas
as necessidades do homem, não só sofre para salvar o homem assumindo toda a
tragédia da humanidade, mas morre pelo homem.
A morte de Cristo recorda o cúmulo de
sofrimento e de males que pesa sobre a humanidade de todas as épocas: o peso
esmagador do nosso morrer, o ódio e a violência que ainda hoje ensanguentam a
terra. A paixão do Senhor continua nos sofrimentos dos homens. Como justamente
escreve Blaise Pascal, "Jesus permanecerá em agonia até ao fim do
mundo; não se deve dormir durante este tempo". Se a Sexta-Feira Santa
é um dia cheio de tristeza, é portanto ao mesmo tempo, um dia muito propício
para despertar a nossa fé, para reforçar a nossa esperança e a coragem de
carregar cada qual a sua cruz com humildade, confiança e abandono a Deus, na
certeza do seu apoio e da sua vitória. A liturgia deste dia canta: O Crux,
ave, spes unica Ave, ó cruz, única esperança".
Esta esperança alimenta-se no grande silêncio
do Sábado Santo, na expectativa da ressurreição de Jesus. Neste dia as
Igrejas não estão ornamentadas e não são previstos particulares ritos
litúrgicos. A Igreja vigia em oração como Maria e juntamente com Maria,
compartilha os mesmos sentimentos de dor e de confiança em Deus. Justamente se
recomenda que se conserve durante todo o dia um clima orante, favorável à
meditação e à reconciliação; encorajam-se os fiéis a aproximar-se do sacramento
da Penitência, para poder participar realmente renovados nas Festas pascais.
O recolhimento e o silêncio do Sábado Santo nos
conduzem na noite à solene Vigília pascal, "mãe de todas as
vigílias", quando irromper em todas as igrejas e comunidades o cântico
da alegria pela ressurreição de Cristo. Mais uma vez, será proclamada a vitória
da luz sobre as trevas, da vida sobre a morte, e a Igreja rejubilará no
encontro com o seu Senhor. Entraremos assim no clima da Páscoa de
Ressurreição.
Queridos irmãos e irmãs, predisponhamo-nos a
viver intensamente o Tríduo Santo, para sermos cada vez mais
profundamente partícipes do Mistério de Cristo.
A Virgem Santa, que seguiu em silêncio o Filho
Jesus até ao Calvário, participando com grande dor no seu sacrifício,
cooperando assim no mistério da Redenção e tornando-se Mãe de todos os crentes,
nos acompanha nesse percurso.
Juntamente com ela entraremos no
Cenáculo, permaneceremos aos pés da Cruz, vigiaremos idealmente ao lado de
Cristo morto aguardando com esperança o alvorecer do dia radiante da
ressurreição.
Papa Bento XVI - 08 de abril de 2009
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