quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Querida Amazônia: Indignar-se e pedir perdão - nºs 17 a 19


Ao mesmo tempo que nos deixamos tomar por uma sã indignação, lembremo-nos de que sempre é possível superar as diferentes mentalidades de colonização para construir redes de solidariedade e desenvolvimento: o desafio é assegurar uma globalização na solidariedade, uma globalização sem marginalização. Podem-se encontrar alternativas de pecuária e agricultura sustentáveis, de energias que não poluem, de fontes dignas de trabalho que não impliquem a destruição do meio ambiente e das culturas. Simultaneamente é preciso garantir, para os indígenas e os mais pobres, uma educação adequada que desenvolva as suas capacidades e empoderamento. É precisamente nestes objetivos que se mede a verdadeira astúcia e a genuína capacidade dos políticos. Não servirá para devolver aos mortos a vida que lhes foi negada, nem para compensar os sobreviventes daqueles massacres, mas ao menos para hoje sermos todos realmente humanos.

Anima-nos recordar que, no meio dos graves excessos da colonização da Amazônia, cheia de contradições e lacerações, muitos missionários chegaram lá com o Evangelho, deixando os seus países e aceitando uma vida austera e desafiadora junto dos mais desprotegidos. Sabemos que nem todos foram exemplares, mas o trabalho de quantos se mantiveram fiéis ao Evangelho também inspirou uma legislação, como as Leis das Índias, que protegiam a dignidade dos indígenas contra as violações de seus povos e territórios. E dado que frequentemente eram os sacerdotes que protegiam os indígenas de ladrões e abusadores, aqueles pediam-nos insistentemente – contam os missionários – que não os abandonássemos e faziam-nos prometer que voltaríamos novamente.

E, nos dias de hoje, a Igreja não pode estar menos comprometida, chamada como está a ouvir os clamores dos povos amazônicos, para poder exercer com transparência o seu papel profético. Entretanto como não podemos negar que o joio se misturou com o trigo, pois os missionários nem sempre estiveram do lado dos oprimidos, deploro-o e mais uma vez peço humildemente perdão, não só pelas ofensas da própria Igreja, mas também pelos crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América e pelos crimes atrozes que se seguiram ao longo de toda a história da Amazônia. Aos membros dos povos nativos, agradeço e digo novamente que, com a vossa vida, sois um grito lançado à consciência (…). Vós sois memória viva da missão que Deus nos confiou a todos: cuidar da Casa Comum.

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