Na Amazônia, vivem
muitos povos e nacionalidades, sendo mais de cento e dez os povos indígenas em
isolamento voluntário. A sua situação é fragilíssima; e muitos sentem que são
os últimos depositários dum tesouro destinado a desaparecer, como se lhes fosse
permitido sobreviver apenas sem perturbar, enquanto avança a colonização pós-moderna.
Temos que evitar de os considerar como selvagens não-civilizados; simplesmente
criaram culturas diferentes e outras formas de civilização, que antigamente
registaram um nível notável de desenvolvimento.
Antes da colonização,
os centros habitados concentravam-se nas margens dos rios e lagos, mas o avanço
da colonização expulsou os antigos habitantes para o interior da floresta.
Hoje, a crescente desertificação obriga a novas deslocações muitos, que acabam
por ocupar as periferias ou as calçadas das cidades por vezes numa situação de
miséria extrema, mas também de dilaceração interior devido à perda dos valores
que os sustentavam. Neste contexto, habitualmente perdem os pontos de
referência e as raízes culturais que lhes conferiam uma identidade e um sentido
de dignidade e vão alongar a fila dos descartados. Assim interrompe-se a
transmissão cultural duma sabedoria que, durante séculos, foi passando de
geração em geração. As cidades, que deveriam ser lugares de encontro,
enriquecimento mútuo e fecundação entre diferentes culturas, tornam-se palco
dum doloroso descarte.
Cada povo, que
conseguiu sobreviver na Amazônia, possui a sua própria identidade cultural e
uma riqueza única num universo multicultural, em virtude da estreita relação
que os habitantes estabelecem com o meio circundante, numa simbiose – de tipo
não determinista – difícil de entender com esquemas mentais alheios:
Havia
outrora uma paisagem que despontava com seu rio,
seus animais, suas nuvens e suas árvores.
Às vezes, porém, quando não se via em lado nenhum
a paisagem com seu rio e suas árvores,
competia a tais coisas assomar à mente dum
garotinho.
seus animais, suas nuvens e suas árvores.
Às vezes, porém, quando não se via em lado nenhum
a paisagem com seu rio e suas árvores,
competia a tais coisas assomar à mente dum
garotinho.
Do
rio, fazes o teu sangue (…).
Depois planta-te,
germina e cresce
que tua raiz
se agarre à terra
mais e mais para sempre
e, por último,
sê canoa,
barco, jangada,
solo, jarra,
estábulo e homem.
Depois planta-te,
germina e cresce
que tua raiz
se agarre à terra
mais e mais para sempre
e, por último,
sê canoa,
barco, jangada,
solo, jarra,
estábulo e homem.
Os grupos humanos, seus estilos de vida e
cosmovisões são tão variados como o território, pois tiveram que se adaptar à
geografia e aos seus recursos. Não são iguais as aldeias de pescadores às de
caçadores, nem as aldeias de agricultores do interior às dos cultivadores de
terras sujeitas a inundações. Além disso, na Amazônia, encontram-se milhares de
comunidades de indígenas, afrodescendentes, ribeirinhos e habitantes das
cidades que, por sua vez, são muito diferentes entre si e abrigam uma grande
diversidade humana. Deus manifesta-Se, reflete algo da sua beleza inesgotável
através dum território e das suas caraterísticas, pelo que os diferentes
grupos, numa síntese vital com o ambiente circundante, desenvolvem uma forma
peculiar de sabedoria. Quantos de nós observamos de fora deveríamos evitar
generalizações injustas, discursos simplistas ou conclusões elaboradas apenas a
partir das nossas próprias estruturas mentais e experiências.
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