“A virtude do silêncio”: eis o traço característico
de uma testemunha de humildade e caridade como foi Arsênio de Trigolo, “o frade
dos últimos”, beatificado na manhã de sábado 7 de outubro de 2017 na catedral
de Milão. De
sacerdote diocesano, em um certo ponto se fez jesuíta, e enfim capuchinho. A espiritualidade
de Arsênio de Trigolo é a do século XIX, mas atenção para não nos determos em
aspectos exteriores, na superfície. É indispensável ir em busca do homem que
está por detrás. Neste caso, encontraremos um homem que procura Deus sobre todas
as coisas, que quer fazer unicamente a sua vontade.
As
vicissitudes de sua vida são realmente inúmeras, as mais variadas, ao máximo,
contraditórias, e, ainda assim, é verdade também que jamais perdeu a bússola: “Seja feita a vossa vontade!”.
Então,
o que um capuchinho de ontem pode nos dizer hoje? Qual é a mensagem ou a
palavra mais intensa que o Bem-aventurado Arsênio de Trigolo pode nos dizer
hoje?
A
vida do Bem-aventurado Arsênio encontra a sua síntese naquela reflexão que ele
mesmo escrevia profeticamente em suas Anotações espirituais: “Arsênio,
não deves contentar-te em ter abandonado o mundo, posses, parentes (...), deves
separar-te de tudo isso também com o coração, com o afeto, pois, caso
contrário, a que serve? A nada: para parecer religioso junto ao mundo e, na
realidade, não o ser junto a Deus”. É a tensão que o acompanhou por
toda a vida na busca para ser perfeito “como o vosso Pai celeste é perfeito”
(Mt 5,48).
A
sua vivência tão movimentada, com contínuas mudanças também de estados de vida,
pode ser interpretada como sintoma de uma personalidade fraca, de alguém que
está descontente ou de um sonhador continuamente irrequieto e em busca de uma
solidez jamais encontrada. Lendo sua
vida com atenção, contudo, descobre-se uma personalidade que soube acolher a
contínua desestabilização que Deus realizava para guiá-lo à perfeição. Mudar
estado de vida deixando os afetos e as relações tão arduamente construídos,
abandonando os lugares e as certezas encontradas com tenacidade, evidenciam o
seu ser continuamente disponível não apenas em buscar a vontade de Deus, mas a
deixar-se plasmar e trabalhar por Deus, aceitando as fadigas das circunstâncias
concretas, sem jamais desencorajar-se, melhor, rendendo- -se à vontade de Deus.
O
Bem-aventurado Arsênio nasceu em Trigolo, próximo de Cremona, em 13 de junho de
1849, quinto de doze filhos. Foi batizado seis dias depois com o nome de
Giuseppe, na igreja de São Bento em Trigolo. Os pais, Glicerio Migliavacca e
Annunciata Stumia, sinceramente fiéis, eram proprietários de uma pousada e de
um comércio de pães, com os quais podiam sustentar a numerosa família.
Ainda
criança, desejoso de servir ao Senhor no caminho do ministério ordenado, entrou
no seminário de Cremona, cumprindo o itinerário formativo de 1863 a 1873,
naquele clima cultural e político condicionado pelas relações pouco felizes
entre o Reino da Itália e o Estado Pontifício.
A
opção de Giuseppe, aos catorze anos, de ser sacerdote, não foi certamente uma
escolha de comodidade ou de estabilização da própria vida, foi uma escolha
corajosa, madura, decidida, de alguém que não tem medo do ambiente cultural e
social que o circundava.
A
aspiração do jovem Giuseppe era clara e forte: ser um sacerdote santo! Assim escreve nas Anotações Espirituais: “Oh,
quanto maior bem se faria ao povo se o sacerdote fosse mais perfeito: a ciência
é boa, é muito necessária, sem a qual não pode ser ordenado sacerdote, mas
esta, separada da verdadeira piedade, da perfeição, infla o espírito e se eleva
em soberba. A verdadeira piedade nos faz conhecer o nosso nada, a nossa
miséria, e que tudo temos de Deus e, portanto, tudo a ele remetemos. Sem a
verdadeira piedade, frequentemente se torna de empecilho a Deus”.
Não
era, contudo, um sonhador, conhecia os seus limites e, portanto, sabia bem da
necessidade urgente e contínua da graça de Deus para sustentar a sua
determinação em seguir Jesus, e de ser sacerdote para Jesus e em Jesus.
Piedade, estudo, graça, humildade, eram os seus baluartes para ser um santo
sacerdote.
Em
21 de março de 1874, recebeu a ordenação sacerdotal, e foi enviado como
coadjutor do pároco em Paderno di Ossolaro e, em seguida, a Cassano d’Adda.
Uma
escolha, como a de ser sacerdote, que parecia estar bem enraizada e
sinceramente vivida com afinco, contudo, escreve nas Anotações Espirituais, “há
vários anos” sentia o desejo de uma consagração religiosa, em uma oferta que
pudesse ser um dedicar-se completamente a Deus.
Com
coragem, decidiu entrar na Companhia de Jesus. Era o dia 14 de dezembro de
1875. Não desejando outra coisa senão fazer a vontade de Deus “apesar
de qualquer coisa que me acontecesse, tomá-la-ei por vossa vontade e, por isso,
não me agitarei”, emitiu a primeira profissão religiosa em 1877, com a
idade de 28 anos.
Transferido
como Prefeito no Colégio de Cremona em 1879, levou a termo a filosofia e,
sucessivamente, em 1884, em Porto Ré, na Ístria, retomou o estudo da teologia,
mas com resultados escassos. Passado o ano de prova em Lainz, próximo de Viena,
em 15 de agosto de 1888 em Veneza, emitia a Profissão solene como “coadjutor
espiritual formado”. Estimado por todos, continua o seu ministério como
pregador, confessor, diretor de exercícios espirituais, sobretudo para as
comunidades religiosas femininas, e de catequese aos jovens.
Em
Veneza, nos anos entre 1888 e 1890, reencontra Pasqualina Giuseppina Fumagalli,
então demitida das Irmãs de Notre Dame du Bon Secours, que continuava, contudo,
a vestir-se como religiosa. Também tinha iniciado um Instituto religioso,
chamado “da Consoladora”, sem obter a permissão dos respectivos Bispos, e
reunira ao seu redor certas moças, algumas das quais encaminhadas pelo próprio
Bem-aventurado Arsênio. É esta complexa relação com Fumagalli, julgada
negativamente pelos Superiores da Companhia de Jesus, que levará à decisão de
transferi-lo primeiramente a Trento, em seguida a Piacenza e, enfim, de pedi-lo
para deixar a Companhia. Em 24 de março de 1892, após uma breve tentativa de
resistência, foi-lhe imposto de se demitir. São os anos da maior
desestabilização.
Só,
sem nada, com um fracasso e um juízo não certamente louvável às costas, quem
não teria se fechado, isolado, amargurado, tornando-se um contestador vazio? E,
mesmo assim, em 25 de abril de 1892, chegava a Turim, ainda uma vez disponível
para fazer a vontade de Deus, que passava através de circunstâncias também
dolorosas e decisões impostas por outros.
Apresentado
ao Arcebispo Davide dei Conti Riccardi, assume de fato a direção espiritual do
novo Pio Instituto de Maria Consoladora, formado por um grupo de religiosas que
tinha se afastado de Fumagalli.
Aos
quarenta e dois anos, encaminha-se por uma nova estrada, quando talvez fosse o
tempo da colheita das fadigas juvenis e das alegrias da idade madura.
Assim,
por dez anos (1892-1902), dá forma, norma e guia ao novo Instituto presente em
Turim e, sucessivamente, também em Milão, escrevendo-lhe a Regra e as
Constituições. Tudo parece navegar rumo a um porto seguro, mas, no primeiro
Capítulo Geral, realizado em 1899, começou a apresentar-se conflito entre as
religiosas de Milão e as de Turim, desavenças que levaram o Arcebispo de Milão,
o Bem-aventurado André Carlos Ferrari, a renovar todos os encargos e a pedir ao
Bem-aventurado Arsênio para voltar atrás e deixar a direção do Instituto.
Ainda
uma vez, é desestabilizado, ainda uma vez, a vontade de Deus se manifesta
através de uma ruptura dolorosa.
Assim,
com a idade de cinquenta e três anos, após ter obtido o voto favorável dos
vários Superiores, em 21 de junho de 1902 o Bem-aventurado Arsênio iniciava um
novo estilo de vida, entrando no noviciado dos Frades Menores Capuchinhos em
Lovere. O novo estado de vida, exigente, também lhe dava um novo nome: Frei Arsênio de Trigolo.
Mesmo
já idoso, o Bem-aventurado Arsênio escolheu coisas difíceis. A mudança do nome
era a coisa mais simples, que mais profundamente colocava em prática o que
tantas vezes tinha dito às religiosas: pedi ao Senhor a cada dia “o
amor operoso, que é a verdadeira caridade em fatos e obras” (Cf.
Pregações para as Missões ao povo). Emitidos os votos temporários, foi enviado
a Bérgamo para guiar espiritualmente os jovens estudantes capuchinhos. Aqui,
excetuado um breve período de ulterior afastamento, transcorreu os últimos anos
no ministério pastoral e assistindo a Terceira Ordem.
Em
1909, começou a manifestar os problemas de saúde. Transferido do convento à
enfermaria, na noite de 10 de dezembro de 1909 morreu por aneurisma cardíaco. O
seu funeral, celebrado na simplicidade franciscana, viu uma imponente
participação do povo, que testemunhou o bem por ele semeado.
A
oração diária, a Eucaristia celebrada, o fazer a caridade concreta aos tantos
necessitados, tinham realizado nele aquela transformação que acontece em quem
põe toda a sua confiança em Deus e na sua Palavra viva: envolver no silêncio,
no retiro e no perdão, sem jamais deixar escapar nada de si, seja o mal
recebido, como o bem realizado, e deixar ao “Senhor que vê no segredo” a
recompensa.
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