No capítulo 25 do Evangelho de
Mateus, Jesus volta a deter-se numa destas bem-aventuranças: a que declara
felizes os misericordiosos. Se andamos à procura da santidade que agrada a
Deus, neste texto encontramos precisamente uma regra de comportamento com base
na qual seremos julgados: “Tive fome e destes-Me de comer, tive sede e
destes-Me de beber, era peregrino e recolhestes-Me, estava nu e destes-Me que
vestir, adoeci e visitastes-Me, estive na prisão e fostes ter comigo” (25,
35-36).
Deste modo, ser santo não
significa revirar os olhos num suposto êxtase. O texto de Mateus não é um mero convite à caridade, mas uma página de cristologia
que projeta um feixe de luz sobre o mistério de Cristo. Neste apelo a
reconhecê-Lo nos pobres e atribulados, revela-se o próprio coração de Cristo,
os seus sentimentos e as suas opções mais profundas, com os quais se procura
configurar todo o santo.
O Senhor deixou-nos bem claro que a santidade não se pode
compreender nem viver prescindindo destas suas exigências, porque a
misericórdia é o coração pulsante do Evangelho.
Quando encontro uma pessoa a
dormir ao relento, numa noite fria, posso sentir que este vulto seja um
imprevisto que me detém, um delinquente ocioso, um obstáculo no meu caminho, um
aguilhão molesto para a minha consciência, um problema que os políticos devem
resolver e talvez até um monte de lixo que suja o espaço público. Ou então posso reagir a partir da fé e da
caridade e reconhecer nele um ser humano com a mesma dignidade que eu, uma
criatura infinitamente amada pelo Pai, uma imagem de Deus, um irmão redimido
por Jesus Cristo. Isto é ser cristão! Ou poder-se-á porventura entender a
santidade prescindindo deste reconhecimento vivo da dignidade de todo o ser
humano?
Para os cristãos, isto supõe
uma saudável e permanente insatisfação. Embora dar alívio a uma única pessoa já
justificasse todos os nossos esforços, para nós isso não é suficiente. Com
clareza o afirmaram os Bispos do Canadá ao mostrar como nos ensinamentos
bíblicos sobre o Jubileu, por exemplo, não se trata apenas de fazer algumas
ações boas, mas de procurar uma mudança social: para que fossem libertadas
também as gerações futuras, o objetivo proposto era claramente o
restabelecimento de sistemas sociais e económicos justos, a fim de que não
pudesse haver mais exclusão.
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