João Garcia, quando ainda jovem universitário, era conhecido
como “o
santo rapaz”. Foi um dos grandes reformadores que ilustraram a Espanha
na época da Contrarreforma católica.
A intrépida Santa Teresa d’Ávila, passando por Almodóvar del Campo durante a epopeia
de suas fundações, hospedou-se na casa de Marcos Garcia e Isabel Lopez. O casal
pediu-lhe que desse uma bênção aos seus numerosos filhos. Fixando os olhos
sobre o pequeno João, disse-lhe a reformadora: “Estuda bem, Joãozinho, porque tu
me imitarás um dia”. O que queria ela dizer? Numa segunda visita àquela
casa, Santa Teresa pediu para ver novamente as crianças. Pondo a mão na cabeça
de João Garcia, ela foi desta vez mais precisa: "Tendes aqui um filho que se
tornará um grande santo. Ele será o pai e diretor de muitas almas e reformador
de uma grande obra, que se conhecerá oportunamente". De fato, ele
correspondeu às predições da reformadora do Carmelo.
João Garcia nasceu no dia 10 de julho de 1561, conterrâneo e
coetâneo de outro grande santo, São João d’Ávila. Desde o berço foi inclinado à
piedade; sua mãe, para aplacar o choro comum nas crianças, apenas mostrava-lhe
uma imagem da Mãe de Deus, e logo ele sorria embevecido.
Aos 10 anos de idade João Garcia já era um asceta e passou a
dormir em uma prancha de madeira, tendo como travesseiro uma pedra. Um dia o
pai, vendo-o nesse leito de penitência, caiu em prantos. Pegando o pequeno nos
braços, levou-o para seu próprio leito, sem resistência.
Mas, tão logo o pai adormeceu, levantou-se e voltou para sua
prancha e sua pedra. Exercia uma caridade extrema para com os pobres. Certo
dia, deu a própria camisa a um mendigo que sofria febre e frio. Logo que este
vestiu a camisa, viu-se curado.
Aos nove anos João Garcia soube que uma santa havia
consagrado sua virgindade a Deus. Correu então a lançar-se aos pés de uma
imagem da Virgem das virgens, e pediu-lhe que aceitasse também sua virgindade,
concedendo-lhe a graça de viver sem a mais leve mancha.
Ainda adolescente, resolveu entrar o quanto antes para um
convento. Mas tinha dúvidas entre os carmelitas descalços, então em seu
primitivo fervor, e os trinitários, fundados alguns séculos antes por São João
de Matha, mas que estavam infelizmente decadentes. Quando rezava para que Deus
o inspirasse a fazer aquilo que fosse para sua glória, ouviu distintamente uma
voz dizendo-lhe que daria mais glória a Deus entrando nos trinitários, o que
fez aos 19 anos de idade.
Em seu noviciado, João Garcia teve por mestre o futuro santo
Simão de Rojas. Embora por humildade não quisesse tornar-se presbítero, os
superiores, vendo seus dotes tão extraordinários, o obrigaram a preparar-se
para o sacerdócio. "Tinha recebido do Céu um talento tão raro, que Lope de
Vega (escritor e poeta do século de ouro espanhol) o chamava 'o mais belo gênio
da Espanha'; adquiriu tantos conhecimentos, que o Pe. Entrade, jesuíta,
assegurava ser ele 'o homem mais erudito do seu século'", o que não é dizer
pouco numa época em que os grandes espíritos não eram raros. Por sua
eloquência, seus confrades o comparavam a São João Crisóstomo e a São Bernardo
de Claraval.
Frei João Garcia frequentemente foi alvo de ataques dos
demônios. Certa vez lançaram-no num poço, mas seu Anjo da Guarda o amparou na
queda e o trouxe à tona. Também foi vítima dos homens. Em Sevilha, entregara-se
à conversão de um grupo de mouros. Alguns deles se converteram, mas a maioria
não. Tentaram mesmo matá-lo, envenenando sua comida. O religioso fez o sinal da
cruz sobre o alimento, que se cobriu imediatamente de vermes. Os infiéis
tentaram então assassiná-lo, mas Deus o protegeu, nada sofrendo.
Frei João Garcia levava uma vida santa entre os trinitários
quando, em 8 de maio de 1594, um capítulo geral reunido em Valladolid, para
combater a decadência da Ordem, decretou que em cada província dela houvesse
dois ou três conventos nos quais se praticasse a regra primitiva, como Santa
Teresa o fizera no Carmelo. Frei João Garcia foi designado para o de
Valdepeñas.
Entrou para essa reforma no início de 1597. Eleito superior,
restabeleceu a regra primitiva, fez com que os religiosos trocassem o nome de
família pelo de um santo - ele tomou o de João Batista da Conceição - e fez com
que se observasse a vigília de todas as festas da Santíssima Virgem.
Em sua reforma encontrou inúmeros obstáculos por parte dos
religiosos, que não queriam viver uma vida de penitência. Por isso viajou a
Roma para obter a sanção do Santo Padre. Em Roma seus superiores o haviam
precedido e minado o terreno, de maneira que ele se viu praticamente só. Não
totalmente, pois recebeu o conforto e amparo de dois grandes santos: São Camilo
de Lellis, fundador dos camilianos, e o grande São Francisco de Sales, então
bispo eleito de Genebra, e que fora a Roma receber a sagração episcopal. Também
este santo lhe predisse os sofrimentos pelos quais teria que passar, e que Deus
abençoaria seus esforços. Quase dois anos depois, em 20 de agosto de 1599, o
Papa Clemente VIII, com oBreve “Ad militantis Ecclesiae regimen”, aprovou e
erigiu canonicamente os Trinitários Descalços e Reformados.
De volta à Espanha, Frei João Batista entrou na posse do
convento de Valdepeñas. Mas à noite os religiosos antigos, que haviam deixado o
convento por rejeitarem a reforma, invadiram o prédio, amarraram o santo com
cordas e o arrastaram pelo claustro. Quiseram mesmo lançá-lo num poço, mas
depois, dado seu estado de fraqueza, resolveram colocá-lo na prisão. Enfim, na
manhã seguinte, temendo a repressão do poder civil, esses péssimos religiosos
libertaram seu superior e fugiram.
Frei João Batista ficava assim só, com sua reforma. Mas em
breve a Providência suscitou novos súditos, e logo se lhe juntaram 16 frades
desejosos de uma vida mais perfeita. Após ter feito um ano de noviciado
juntamente com os frades fiéis, Frei João Batista pronunciou de novo seus
votos. A reforma assim estava salva.Em poucos anos foram fundados oito
conventos da reforma, e em 1605 Frei João Batista foi eleito Provincial.
Enfim, Frei João Batista da Conceição, gasto pelos inúmeros
trabalhos e penitências, chegou ao termo de sua vida. Com apenas 52 anos de
idade, rendeu sua alma a Deus no dia 14 de fevereiro de 1613, exclamando com os
olhos fixos no crucifixo: "Senhor, vós bem sabeis que eu fiz tudo que pude
para executar vossas ordens".
No ano 1975, em 25 de maio, festa da Santíssima Trindade, na
basílica de São Pedro, em Roma, o Papa Paulo VI o proclamou santo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário