Vivendo no auge do Renascimento europeu, quando os nobres
levavam uma vida esplêndida, luxuosa, esquecidos dos pobres e necessitados, Joana, princesa portuguesa, praticou a virtude da mortificação na própria corte, a ponto de tomar
como emblema a coroa de espinhos de Nosso Senhor Jesus Cristo. Sua atitude
entrava em choque com todas as tendências da época e repercutiu, nesse período
já adiantado da Renascença, como uma espécie de reminiscência da Idade Média.
Também dentro do convento o modo como ela praticava as
virtudes religiosas era um agir contra, pois as religiosas viviam de um modo
muito relaxado naquele tempo. Era uma época de grande decadência das ordens
religiosas.
Após súplicas e orações incessantes, pois ainda não havia
herdeiro para o trono, nasceu Joana, a filha primogênita do rei D. Afonso V,
décimo segundo rei de Portugal, e de sua esposa, Dona Isabel, no dia 6 de
fevereiro de 1452, e foi jurada princesa herdeira do trono. Trocou esse título
pelo de Infanta depois do nascimento de seu irmão, que foi o rei D. João II.
Sua mãe faleceu quando Joana tinha apenas quatro anos.
A nobre menina cresceu educada com grande esmero pela Princesa
Dona Beatriz de Meneses, que, de personalidade marcante, chegou a exercer
temporariamente a regência do Reino.
Enquanto viveu na corte, praticou as mais altas virtudes
cristãs. Tomou como emblema uma coroa de espinhos e, debaixo de suas ricas
vestes, ninguém suspeitava que usava um cilício. Jejuava a pão e água,
especialmente às sextas-feiras.
Profundamente compassiva, procurava o quanto podia
amenizar as misérias de seu próximo. Encarregou uma pessoa de distribuir suas
esmolas e anotava num livro os nomes dos necessitados, o grau de pobreza de
cada um e o dia em que a esmola lhes devia ser dada. Na Quinta-feira Santa,
lavava os pés de doze mulheres pobres; despedia-as depois de lhes dar roupas
novas e dinheiro.
Era tão formosa que, segundo afirma Frei Luís de Sousa,
vieram pintores de outras nações para retratá-la. Muitos príncipes pediram-lhe
a mão insistentemente, mas negou-a a todos. Joana aspirava ardentemente entrar
para uma ordem religiosa, mas as dificuldades eram muitas. Teve que lutar
contra as resistências de seu pai e de seu irmão, que preferiam que ela fizesse
um casamento vantajoso.
Em 1471, Dom Afonso V tomou Arzila e ocupou Tanger,
abandonada pelos mouros. Quando de seu retorno ao Reino, Joana, aproveitando o
clima de euforia, disse-lhe que os monarcas da antiguidade costumavam oferecer
sacrifícios aos deuses quando alcançavam qualquer vitória, que ele oferecesse
também a Deus o sacrifício de sua única filha. D. Afonso não pode negar o
que ela lhe pedia, consentindo que entrasse para um convento, apesar de os
príncipes e as damas da corte acharem isto inconveniente.
Encerrou-se no Mosteiro de Jesus, da Ordem de São
Domingos, em Aveiro, onde sua humildade e obediência foram tão grandes, que
ninguém podia dizer que ali estava uma filha de rei. Levou sua
humildade até o ponto de lavar roupa, amassar pão, varrer o convento. Aprendeu
a fiar e a tecer. Do linho preparado por ela se faziam os corporais para a
igreja.
Em 1479, a peste assolou o país. Joana,
obedecendo ao pai, rumou para o Alentejo, aonde a peste não chegara. Passados
onze meses Joana voltou a Aveiro.
Em 1481, faleceu D. Afonso, seu querido pai, a quem
sucedeu seu irmão D. João II. Todos esses infortúnios a aproximavam cada vez
mais de Deus; não havendo nada neste mundo que a prendesse, suspirava pelo céu.
Trabalhava pela conversão das almas, pois a preocupava
muito a sorte dos pecadores. A sua obra predileta foi a redenção dos cativos da
África. Sua breve vida foi um holocausto de amor e de sacrifício.
Sua saúde começou a declinar em 1489, e em princípios de maio
de 1490 reconheceu que sua morte estava próxima. Na madrugada do dia 12 de
maio, a comunidade reuniu-se em torno de seu leito e rezou o Ofício da Agonia.
À invocação Omnes Sancti Innocentes, orate pro ea, Joana abriu os
olhos e ergueu-os para o Céu por um breve espaço de tempo; depois, expirou
suavemente.
Em seu túmulo ocorreram inúmeros milagres obtidos por sua
intercessão; a memória de Joana foi sempre guardada em Aveiro.
O Papa Inocêncio XII a beatificou, confirmando o seu
culto, em 1693. D. Pedro II mandou construir um túmulo luxuoso depois da
beatificação, para onde foram trasladados os seus santos despojos e onde ainda
hoje se conservam.
A 5 de janeiro de 1963, Paulo VI a declarou especial
protetora da cidade de Aveiro.
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