sábado, 28 de abril de 2018

O coração de Cristo - Gaudete et Exsultate n.ºs 95 a 99


No capítulo 25 do Evangelho de Mateus, Jesus volta a deter-se numa destas bem-aventuranças: a que declara felizes os misericordiosos. Se andamos à procura da santidade que agrada a Deus, neste texto encontramos precisamente uma regra de comportamento com base na qual seremos julgados: “Tive fome e destes-Me de comer, tive sede e destes-Me de beber, era peregrino e recolhestes-Me, estava nu e destes-Me que vestir, adoeci e visitastes-Me, estive na prisão e fostes ter comigo” (25, 35-36).

Deste modo, ser santo não significa revirar os olhos num suposto êxtase. O texto de Mateus não é um mero convite à caridade, mas uma página de cristologia que projeta um feixe de luz sobre o mistério de Cristo. Neste apelo a reconhecê-Lo nos pobres e atribulados, revela-se o próprio coração de Cristo, os seus sentimentos e as suas opções mais profundas, com os quais se procura configurar todo o santo.

O Senhor deixou-nos bem claro que a santidade não se pode compreender nem viver prescindindo destas suas exigências, porque a misericórdia é o coração pulsante do Evangelho.

Quando encontro uma pessoa a dormir ao relento, numa noite fria, posso sentir que este vulto seja um imprevisto que me detém, um delinquente ocioso, um obstáculo no meu caminho, um aguilhão molesto para a minha consciência, um problema que os políticos devem resolver e talvez até um monte de lixo que suja o espaço público. Ou então posso reagir a partir da fé e da caridade e reconhecer nele um ser humano com a mesma dignidade que eu, uma criatura infinitamente amada pelo Pai, uma imagem de Deus, um irmão redimido por Jesus Cristo. Isto é ser cristão! Ou poder-se-á porventura entender a santidade prescindindo deste reconhecimento vivo da dignidade de todo o ser humano?

Para os cristãos, isto supõe uma saudável e permanente insatisfação. Embora dar alívio a uma única pessoa já justificasse todos os nossos esforços, para nós isso não é suficiente. Com clareza o afirmaram os Bispos do Canadá ao mostrar como nos ensinamentos bíblicos sobre o Jubileu, por exemplo, não se trata apenas de fazer algumas ações boas, mas de procurar uma mudança social: para que fossem libertadas também as gerações futuras, o objetivo proposto era claramente o restabelecimento de sistemas sociais e económicos justos, a fim de que não pudesse haver mais exclusão.

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