quinta-feira, 3 de maio de 2018

Sinais de Santidade no mundo de hoje: Ousadia e ardor - Gaudete et Exsultate nºs 129 a 139

Ao mesmo tempo, a santidade é parresia: é ousadia, é impulso evangelizador que deixa uma marca neste mundo. Para isso ser possível, o próprio Jesus vem ao nosso encontro, repetindo-nos com serenidade e firmeza: “não temais!” “Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos”. Estas palavras permitem-nos partir e servir com aquela atitude cheia de coragem que o Espírito Santo suscitava nos Apóstolos, impelindo-os a anunciar Jesus Cristo. Ousadia, entusiasmo, falar com liberdade, ardor apostólico: tudo isto está contido no termo parresia, uma palavra com que a Bíblia expressa também a liberdade duma existência aberta, porque está disponível para Deus e para os irmãos.

O Beato Paulo VI mencionava, entre os obstáculos da evangelização, precisamente a carência de parresia, “a falta de ardor, tanto mais grave [porque] provém de dentro”. Quantas vezes nos sentimos instigados a deter-nos na comodidade da margem! Mas o Senhor chama-nos a navegar pelo mar adentro e lançar as redes em águas mais profundas. Convida-nos a gastar a nossa vida ao seu serviço. Agarrados a Ele, temos a coragem de colocar todos os nossos carismas ao serviço dos outros. Oxalá pudéssemos sentir-nos impelidos pelo seu amor e dizer com São Paulo: “ai de mim se eu não evangelizar!”

parresia é selo do Espírito, testemunho da autenticidade do anúncio. É uma certeza feliz que nos leva a gloriar-nos do Evangelho que anunciamos, é confiança inquebrantável na fidelidade da Testemunha fiel, que nos dá a certeza de que nada “poderá separar-nos do amor de Deus”.

Precisamos do impulso do Espírito para não ser paralisados pelo medo e o calculismo, para não nos habituarmos a caminhar só dentro de ambientes seguros. Lembremo-nos disto: o que fica fechado acaba cheirando a mofo e criando um ambiente doentio.

À semelhança do profeta Jonas, sempre permanece latente em nós a tentação de fugir para um lugar seguro, que pode ter muitos nomes: individualismo, espiritualismo, confinamento em mundos pequenos, dependência... Talvez nos sintamos relutantes em deixar um território que nos era conhecido e controlável.

Deus é sempre novidade, que nos impele a partir sem cessar e a mover-nos para ir mais além do conhecido, rumo às periferias e aos confins. Leva-nos aonde se encontra a humanidade mais ferida e aonde os seres humanos, sob a aparência da superficialidade e do conformismo, continuam à procura de resposta para a questão do sentido da vida. Deus não tem medo! Não tem medo! Ultrapassa sempre os nossos esquemas e não Lhe metem medo as periferias.

É verdade que precisamos de abrir a porta a Jesus Cristo, porque Ele bate e chama. Mas, pensando no ar irrespirável da nossa auto centralidade, pergunto-me se às vezes Jesus não estará já dentro de nós, batendo para que O deixemos sair.

O comodismo seduz-nos e diz-nos que não tem sentido procurar mudar as coisas, que nada podemos fazer perante tal situação, que sempre foi assim e todavia sobrevivemos. Pelo hábito, já não enfrentamos o mal e permitimos que as coisas continuem como estão. Deixemos então que o Senhor venha despertar-nos, dar-nos uma sacudida na nossa sonolência, libertar-nos da inércia.

Move-nos o exemplo de tantos sacerdotes, religiosas, religiosos e leigos que se dedicam a anunciar e servir com grande fidelidade, muitas vezes arriscando a vida e, sem dúvida, à custa da sua comodidade. O seu testemunho lembra-nos que a Igreja não precisa de muitos burocratas e funcionários, mas de missionários apaixonados, devorados pelo entusiasmo de comunicar a verdadeira vida. Os santos surpreendem, desinstalam, porque a sua vida nos chama a sair da mediocridade tranquila e anestesiadora.

Peçamos ao Senhor a graça de não hesitar quando o Espírito nos exige que demos um passo em frente; peçamos a coragem apostólica de comunicar o Evangelho aos outros e de renunciar a fazer da nossa vida um museu de recordações. Em qualquer situação, deixemos que o Espírito Santo nos faça contemplar a história na perspectiva de Jesus ressuscitado. Assim a Igreja, em vez de cair cansada, poderá continuar em frente acolhendo as surpresas do Senhor.


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