No ano 313 de nossa era, Constantino Magno dava
liberdade à Igreja Católica, que saía assim das catacumbas para evangelizar o
mundo, seguindo o mandado de Nosso Senhor Jesus Cristo aos Apóstolos.
Três anos depois, nascia em
Sabaria da Panônia (Hungria), em uma família pagã, um de seus mais ilustres
filhos, São Martinho de Tours.
Seu pai, um veterano tribuno
militar, odiava mortalmente o cristianismo, afirmando que não podia ser
verdadeira uma Religião que ensinava a amar os inimigos e a dar a outra face.
Por razões de serviço, a
família mudou-se para Pavia, na Itália, onde Martinho fez seus primeiros
estudos e conheceu de perto a verdadeira Religião. As virtudes e exemplos dos
cristãos muito impressionou o menino de apenas 10 anos de idade. Iluminado pela
graça, ele conseguiu inscrever-se, sem conhecimento dos pais, no número dos
catecúmenos.
Aos 12 anos começou a sonhar
com uma vida recolhida, na qual pudesse entregar-se inteiramente à contemplação
e à busca da perfeição. Mas o pai de modo algum queria ouvir falar disso.
Descontente com a influência que a Religião cristã estava exercendo sobre o
filho, quis afastá-lo dela.
Aproveitou-se de um edito
imperial mandando que os filhos dos oficiais se alistassem no exército, para aí
inscrever Martinho apesar de ele ter apenas 15 anos de idade.
Deus, que o destinava a ser mais tarde o modelo dos
solitários, dos bispos e dos apóstolos, quis antes mostrar aos jovens
militares, em sua pessoa, que a alma mais pura pode conservar-se intacta sob as
armas; que uma fé sólida e piedosa se alia admiravelmente com a coragem do
herói.
Os filhos dos tribunos eram
logo nomeados ao que corresponde hoje à categoria de sub-oficiais. Nessa
qualidade, Martinho recebeu um ordenança para atendê-lo. Praticava com ele a
mais extrema caridade cristã, o que era inteiramente novo entre aqueles
militares endurecidos pelo paganismo nos campos de batalha. Distribuía entre os
pobres e necessitados quase todo seu soldo.
O historiador Sulpício
Severo, contemporâneo e biógrafo do santo, diz que ele soube, no exército,
conciliar seus novos deveres com as aspirações de sua alma, levando uma vida de
monge e de soldado – casta e sóbria, amável e valorosa.
O
memorável fato do manto dividido
Martinho estava no exército
e era ainda catecúmeno, quando se deu o fato que é narrado em todas as suas
biografias. Certo dia de inclemente inverno, estando as tropas aquarteladas em
Amiens, saiu para dar uma batida nos arredores da cidade. Às suas portas foi
abordado por um mendigo quase desnudo, tremendo de frio, que lhe pediu uma
esmola. Não encontrando nada para dar-lhe, cortou seu manto de lã ao meio e lhe
deu uma parte.
Na noite seguinte, viu em
sonhos anjos que cobriam a espádua de Nosso Senhor com a metade do manto dado
por ele. O divino Salvador disse então: “Martinho, embora ainda catecúmeno, deu-me esta veste”.
Pouco depois, pela Páscoa do
ano 339, recebeu finalmente o batismo, mas não conseguiu licença para deixar o
exército.
Dois anos depois os francos
invadiram as Gálias, e o imperador do Ocidente, Constâncio, convocou seu
exército às armas. Para conquistar o ânimo de seus soldados, quis ele mesmo
dar-lhes uma certa quantia em dinheiro como incentivo para a batalha. Quando
chegou a vez de Martinho recebê-la, pediu ao imperador licença para deixar o
exército e entrar no serviço de Deus.
Irritado com o que julgava
uma defecção às vésperas do combate, Constâncio chamou-o de covarde, querendo
fugir por temor à batalha. Cheio de dignidade, ele respondeu:“Para que vejais que esse
não é meu pensamento, amanhã eu me colocarei na primeira linha do combate, sem
elmo nem couraça, protegido apenas pelo sinal da cruz, e assim romperei sem
temor a linha do inimigo. Se voltar são e salvo, será somente pelo nome de
Jesus, a quem desejo servir daqui para a frente”.
Deus poupou-lhe essa
manifestação de fé e coragem, levando os francos a pedirem a paz.
Discípulo
de Santo Hilário de Poitiers
Por esse tempo, Santo
Hilário de Poitiers iluminava a Gália com a luz de sua ortodoxia e ciência.
Como as virtudes se atraem, Martinho foi ter com o “Atanásio do Ocidente” —
assim chamado por seu incessante combate ao arianismo — para tornar-se seu
discípulo. O grande Doutor da Igreja reconheceu nele o mérito extraordinário, e
quis comunicar-lhe as ordens sacras. Por humildade ele consentiu em receber
somente a última delas, a do exorcistado, que bastava para ligá-lo à sé de
Poitiers.
Pouco depois Martinho
resolveu voltar a sua pátria, a fim de tentar converter seus idosos pais. Sua
mãe havia outrora secundado suas boas disposições para a virtude, e teve a dita
de converter-se à verdadeira fé católica. O pai, no entanto, obstinou-se em seu
ódio ao cristianismo e permaneceu pagão.
Nesse meio tempo Santo
Hilário tinha sido exilado para Milão. Martinho foi ter com ele, mas o bispo
ariano Maxêncio o expulsou da cidade. Resolveu retirar-se então para uma
inóspita ilha, aInsula Gallinaria, perto de Gênova, onde viveu alguns anos em
recolhimento e contemplação.
Quando Santo Hilário voltou
para Poitiers, foi novamente procurá-lo. Introduziu aí a vida monástica, com as
bênçãos de Santo Hilário, fundando nas proximidades de Poitiers um mosteiro
chamado Ligue. Em pouco tempo, 80 monges lá cantavam os louvores de Deus. Desse
mosteiro Martinho saía para evangelizar os povoados e os campos ainda dominados
pelo paganismo.
Com o poder de seus milagres
e a força de sua doutrina, ia destruindo templos e ídolos, pregando a
verdadeira Religião por toda parte. Para pregar as verdades do cristianismo,
ele se valia dos “dogmas” fundamentais do druidismo (religião pagã dos celtas),
como a imortalidade da alma e a recompensa futura aos guerreiros valorosos.
Aproveitava-se também dos festivais pagãos para substituí-los por festas
cristãs, além de transformar seus lugares de peregrinação em santuários
dedicados aos santos católicos. “É assim
que, por um profundo entendimento da natureza humana, ele não se esquecia de
conservar, tanto quanto possível, a celebridade que lhes havia feito a
superstição e o concurso dos pagãos, a fim de ganhar mais facilmente os povos e
favorecer a propagação da fé.
Contra
sua vontade, fazem-no bispo de Tours
Em 371 faleceu o bispo de
Tours, São Lidório. Os diocesanos pensaram em Martinho para substituí-lo, mas
havia dois problemas: ele pertencia à diocese de Poitiers; e por humildade não
consentiria em ser bispo.
Usaram então de um estratagema: um dos principais cidadãos
de Tours foi ao mosteiro e lhe suplicou insistentemente que fosse atender sua
esposa, que estava muito doente. A compaixão o fez acompanhá-lo, e acabaram por
sair da diocese de Poitiers e entrar na de Tours. Nesse momento um grupo de
fiéis pegou-o à força e o levou à catedral, onde foi sagrado bispo.
Como bispo-missionário,
continuou a evangelização não só da sua diocese, mas de toda a Gália. Ao
impulso de sua atividade apostólica, nasceram na França as paróquias rurais
onde anteriormente havia focos de idolatria. Ele se tornaria o mais insigne
bispo das Gálias, grande taumaturgo, patrono e protetor perpétuo da nação
francesa.
Qual era o segredo de São Martinho para alcançar tanto
sucesso em sua evangelização?
Dizem seus biógrafos que era
a grande paz e bondade de coração. Jamais foi visto triste ou irritado.
Brilhava em seu rosto uma alegria celestial, que comunicava aos outros. Era de
extrema misericórdia para com todos, mesmo para os pecadores mais endurecidos.
O mundo era para ele um livro de teologia, que o levava a amar a Deus em todas
as suas obras.
São Martinho de Tours
entregou a alma a Deus no ano 397, tornando-se um dos santos mais populares da
Europa, sendo o primeiro santo não mártir a ser venerado pela Igreja.
Relato de um milagre:
Certo dia o santo pregava num povoado pagão em que os habitantes, na primavera, adornavam com flores um sepulcro que alegavam pertencer a um grande mártir. Mas ninguém sabia informar quem era, nem como tinha morrido, e quis acabar com esse culto supersticioso.
Aproximou-se do túmulo e disse com voz imperativa: “Quem quer que sejas, mártir ou não, em nome de Deus eu te mando que nos digas quem és”.
Uma sombra pavorosa saiu do sepulcro e disse com voz lamurienta: “Sou a alma de um ladrão justiçado por seus delitos. Nada tenho de mártir. Enquanto eles gozam da glória, eu estou ardendo nas chamas do inferno”.
Os camponeses, horrorizados, destruíram imediatamente o túmulo.
Entre os milagres atribuídos ao santo durante sua vida, consta a ressurreição de um catecúmeno, para que pudesse receber o batismo. Ressuscitou também o criado de um nobre romano que se tinha enforcado, para tirá-lo das portas do inferno.
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