12 de outubro de 1891, havia
festa na família Stein. Às seis crianças do casal Stein se acrescentava uma
menina, que se chamaria Edith. Desde seus primeiros passos, a pequena Edith estava enquadrada em um clima na
vida judaica. Tudo lhe falava do Povo de Deus, as preces tradicionais recitadas
em hebreu, os ritos do Talmude fielmente observados e, sobretudo o admirável
exemplo de uma mãe profundamente religiosa, mulher forte da Escritura Sagrada,
cuja extraordinária energia e zelo infatigável vão se desenvolver sem descanso,
a partir da morte de seu esposo.
Edith Stein tinha três anos quando seu pai morreu subitamente, em uma viagem de
negócios. Sem hesitação, a mãe chamou tudo a si: o importante comércio de madeiras
e a educação das sete crianças. Ela fez prosperar a ambos.
Zelosa antes de tudo da educação de seus filhos, ela jamais deixou de
conduzi-los à sinagoga, nos dias de sabat. Ela conservou sempre aos olhos de
seus filhos a autoridade indiscutível, diante da qual se inclinavam com amor e
respeito. Edith Stein escreverá dela mais tarde:
"Ainda crianças, podíamos ler, no exemplo de nossa mãe, a verdadeira maneira
de nos comportar. Quando ela dizia: Isto é um pecado, nós sabíamos que ela se
referia a algo de odioso e indigno."
Edith era-lhe particularmente cara. Freqüentemente a mãe sonhava com um grande
futuro para sua filha predileta. Seu desejo deveria se realizar, mas de que
maneira tão diferente!
De um espírito muito receptivo, de inteligência viva e precoce, foi para ela
uma alegria entrar na escola primária, no outono de 1897. Assim começava uma
vida de estudos que ela não abandonaria mais até sua morte.
Escola primária, ginásio, universidade: Edith Stein seguia o curso normal dos
estudos, na sua cidade natal de Breslau. Bem cedo revelou talento excepcional.
O interesse vivo que Edith mostrava por seus estudos não deixou de inquietar
uma mãe vigilante como a sua. Inquietação bem fundada, aliás. Os estudos de
filosofia prejudicavam a piedade da moça. Sempre acompanhando sua mãe à
sinagoga, seu espírito se abria a outros horizontes. Pouco a pouco, ela se
desligava de toda crença profunda em um Deus pessoal.
Ela disse um dia que
permaneceu atéia até vinte e um anos. Como se ela não tivesse também escrito: A sede da verdade era a minha única prece.
Deixando Breslau, ela irá seguir em Gottingen os notáveis ensinamentos do
grande pensador Edmundo Husserl. Em Gottingen deu livre curso a sua paixão dos
estudos e se mostrou de imediato como uma das adeptas mais brilhantes da
fenomenologia husserliana. Esta nova escola filosófica, com a sua volta à
objetividade, sua lógica precisa, sua aspiração à pureza integral das coisas,
respondia bem ao temperamento da jovem judia.
Cedo ela se tornou uma das figuras de primeiro plano de um pequeno grupo de
discípulos de Husserl. O professor Adolphe Reinach, israelita como Husserl e
vários de seus alunos, reunia-os na sua casa. Os debates, por vezes
apaixonados, prolongavam-se até altas horas da noite. Nesta época, passa por
Gottingen o professor Max Scheler. Uma série de conferências religiosas que
proferiu tiverem profunda repercussão. Todo um movimento de conversões se
delineou. Dietrich von Hildebrand entrou na Ordem Terceira de S. Francisco.
Koyré e sua mulher se aproximaram fortemente da Igreja católica. Adolphe
Reinach abraçou o cristianismo durante a guerra de 1914-1918. Só Edith Stein
permanecia inabalável. No seu quarto de estudante, os livros se empilhavam.
Mais inflexível que nunca, ela se encarniçava na procura de seu único ideal: a
verdade na ciência. Mas, sempre aberta à vida, dos outros, ela permanecia a
companheira encantadora e devotada a quem todos podiam recorrer.
Agosto de 1914. A guerra. Nem por um instante, Edith Stein hesitou para
interromper seus caros estudos e engajar-se na Cruz Vermelha. Durante dois anos
devotou-se ao serviço dos feridos, no hospital militar de Mahrisch-Wisskirchen.
Nesse meio tempo, em 1916, o professor Husserl acabava de ser nomeado para a
Universidade de Fribourg-en-Brisgau. Considerando Edith Stein como sua
discípula predileta, convidou-a para assistente particular. Encarregada de
classificar e organizar os manuscritos do mestre, ela adquiriu desta maneira um
conhecimento muito profundo de sua doutrina. Em 1917, doutorou-se com a maior
distinção, defendendo um tese sobre o problema da imanência.
Seu desejo de encontrar a Deus era cada vez mais forte.
No outono de 1921, Edith Stein passou alguns dias de férias na casa de seus
amigos íntimos, os Conrad Martins. Ela relata:
"Um dia escolhi ao acaso uma obra bastante imponente. Intitulava-se: Vida de
Santa Teresa, escrita por Santa Teresa. Eu comecei a ler. Repentinamente
senti-me tão cativada, que não interrompi mais a leitura até o fim. Quando
fechei o livro, pensei comigo mesma: esta é a verdade!"
Fora, a aurora começava a surgir. Edith Stein tinha. passado a noite inteira
lendo. Bruscamente, irrompia a luz de Deus na sua alma.
A sua primeira providência, nesta manhã, foi ir à cidade comprar um catecismo
católico e um livro de missa. Começou imediatamente a estudá-los com todo o
cuidado, e rapidamente assimilou-os. Em seguida resolve assistir à missa
paroquial em Bergzabern.
Pela primeira vez penetrava em uma igreja católica. Vejamos suas impressões:
"Nada me pareceu estranho:
graças ao estudo que havia feito, podia compreender as cerimônias até aos
detalhes. Um padre venerável subindo ao altar celebrou o Santo Sacrifício com
profundo fervor. Terminada a missa, esperei que o celebrante terminasse a sua
ação de graças."
"Seguindo-o ao presbitério pedi-lhe o batismo. Atônito, respondeu-me que a
recepção na Igreja Católica exigia uma preparação. Ele desejava saber durante
quanto tempo eu tinha recebido instrução e quem ma havia dado. Como resposta eu
lhe disse: por favor, padre, interrogue-me!"
O padre começou então o seu exame. As respostas foram perfeitas. Toda a
doutrina católica foi passada em revista. Cheio de admiração, o cura não pode
mais recusar o batismo.
A 1 de janeiro de 1922, Edith Stein foi batizada, escolhendo o prenome de
Teresa. Comungando neste mesmo dia, permaneceu dai em diante fiel à prática da
comunhão quotidiana.
A 2 de fevereiro seguinte, recebe das mãos do bispo de Spire, Monsenhor
Sebastião, o sacramento da confirmação.
Sobre a luz radiosa destes dias de graça, pairava uma sombra: sua mãe.
Desde a primeira infância, Edith Stein tinha se unido a esta mãe admirável,
cujos sentimentos mais íntimos ela partilhava. O trabalho mais urgente não
interrompia a sua correspondência semanal. Qual seria a reação desta mãe
crente, israelita exemplar, ao saber da decisão de sua filha? Poderia ver na
conversão de Edith ao catolicismo outra coisa além de uma suprema infidelidade?
Não expulsaria a filha de casa?
Edith desejava dar-lhe, ela mesma, a noticia. Partiu para Breslau. Encontro
emocionante da mãe e da neófita! Caindo de joelhos diante dela Edith confessou:
"Mamãe, eu sou católica!"
Não houve nada. Mas pela
primeira vez em sua vida, Edith Stein viu sua mãe chorar. A uma notícia tal, a
velha forte sentiu que as forças a abandonavam. E não obstante, apesar da
profunda vala que as separaria daí em diante, a mãe e a filha sentiram que os
seus corações permaneciam profundamente unidos.
A pedido de sua velha mãe, Edith Stein permaneceu seis meses com a família. Por
piedade filial, continuava a acompanhá-la à sinagoga. Longe de renegar o Antigo
Testamento, considerava-o agora como o lento caminho para o Evangelho, que ele
representava no plano de Deus. Seu recolhimento profundo arrancou de sua mãe a
reflexão: Eu nunca vi ninguém rezar
como Edith.
A conversão tinha operado em Edith Stein uma evolução profunda. Ela agora
procurava o seu lugar no campo do Senhor. Renunciando às suas funções na
Universidade de Friburgo, foi para Spiro, onde se colocou sob a direção do cônego
Schwind. A graça trabalhava em sua alma. Pouco a pouco, uma atração profunda a
conduziu ao sacrifício total. O claustro a solicitava. Entretanto, seus
dirigentes dissuadiam-na vivamente, considerando que seus dons excepcionais
indicavam-na para a vida ativa no mundo.
Assim, ela viu seu desejo realizar-se pela metade, quando se lhe permitiu o
retiro à calma de um liceu de religiosas dominicanas, para ensinar a moças. Ao
mesmo tempo, obteve a permissão de partilhar completamente da vida da
comunidade de religiosas.
Eis o testemunho que nos dão dela:
Durante longas horas rezava. Quando as Irmãs chegavam à capela, as quatro ou
cinco horas da manhã, a doutora, já estava ajoelhada no seu lugar. Nunca ela
procurava sobressair; pelo contrário, apagava-se em tudo. E apesar disso, desde
o primeiro contato todos se sentiam subjugados pela grande santidade que
irradiava suavemente de sua pessoa.
Suas funções de professora a encantavam. Ela encontrava nelas a possibilidade
de abrir os jovens espíritos às riquezas de seu próprio mundo interior, de
fortificar a sua fé e de os encaminhar a uma vida verdadeiramente cristã.
Levada por um desejo de um conhecimento mais profundo de sua fé, Edith Stein
tinha retomado seu trabalho filosófico durante suas horas vagas. Pela primeira
vez abordava a obra de S. Tomás de Aquino.
Aliás, o mundo católico tinha a sua atenção voltada para ela, apesar de sua
semi-reclusão. De quando em quando, era solicitada para conferências
filosóficas, pedagógicas e religiosas. Ela as pronunciava em cidades próximas
Sua própria celebridade poderia constituir um perigo para ela. Mas Deus a
conduzia. Depois de cada conferência, tinha pressa de voltar a sua amada
solidão de Spire e mergulhar nas obras de S. Tomás.
Sua reputação já a tinha precedido em Breslau. Cedo ela se tornou o centro de
atração de um numeroso grupo de jovens intelectuais, judeus em sua maioria,
interessados na fé católica. Muitos se converteram, e Edith Stein foi a
madrinha. Na sua família, ela teve a felicidade de ver sua irmã Rosa reunir-se
a ela no catolicismo. Mas sua velha mãe, octogenária, permanecia
inabalavelmente refratária ao catolicismo.
Vários estabelecimentos de ensino superior tendo feito apelos à eminente
filósofa, ela aceitou enfim uma cadeira de pedagogia na universidade de
Munster, na Westphalia. De imediato, conquistou a estima de todos. Uma
brilhante carreira universitária parecia se abrir novamente diante dela.
Mas, Deus tem seus caminhos, que não são os nossos. Ele tinha escolhido, no
seio de seu povo, esta alma privilegiada, Ele a queria totalmente para Si.
O ano de 1933 se iniciava sob inquietantes presságios: a chegada brutal do
nacional socialismo fazia prever perseguições próximas contra os judeus.
Uma tarde, durante a quaresma, Edith Stein teve pela primeira vez uma noticia
destas ameaças. Desde esta hora, a dolorosa apreensão de tantos sofrimentos
reservados a sua raça não deveria deixá-la mais. No começo de abril, de
passagem em Colônia, ela assistiu a uma Hora Santa na capela do Carmelo Lindenthal.
“Eu me dirigia ao Senhor, nos diz ela, e Lhe dizia que
sabia bem que sua Cruz pesaria daí por diante sobre o povo de Israel. Estava
pronta a percorrer este caminho. Que o Senhor me indicasse apenas o que devia
fazer. Quando terminou o ofício, eu tinha a certeza interior de ter sido
atendida. Mas não sabia ainda qual seria a minha Cruz.”
Ela o saberia bem cedo. De retorno a Munster, a 9 de abril seguinte, recebeu o
aviso de que todo ensino e toda publicação estavam interditos aos não arianos.
Ela compreendeu que sua carreira universitária estava terminada. Vários
convites lhe foram feitos do estrangeiro, especialmente da América do Sul. Mas
sua decisão era irrevogável. Há doze anos aspirava com toda a sua alma a vida
contemplativa. Não tinha soado a hora de realizar enfim o seu desejo íntimo?
Não se lhe poderia mais objetar com a necessidade de sua ação no mundo, uma vez
que toda atividade pública lhe era interdita.
O abade de Beuron aquiesceu finalmente ao seu pedido. Imediatamente, Edith
Stein deu os passos necessários para sua admissão no Carmelo de Colônia. Ela
deixou Munster, em julho de 1937, e passou um mês em Colônia. Enfim, partiu
para Breslau, para se despedir definitivamente dos seus.
Lá, tudo se ignorava de sua decisão. Sua irmã Rosa, a quem ela se confiou em
primeiro lugar, ficou surpreendida, mas compreendeu e calou. Pouco a pouco ela
se abriu com seus irmãos e irmãs, pedindo-lhes que nada revelassem a sua mãe.
Como outrora, passava seus dias de espera na intimidade desta mãe venerada. Idosa,
com 84 anos, sentava-se a sua mesa de trabalho e lhe confiava tudo que tinha no
coração. Jamais inquiriu dos projetos futuros de sua filha. Por sua vez, Edith
não desejava apressar a hora da dura revelação.
O momento, porém, devia chegar. Devemos consignar aqui a emocionante descrição
que Edith nos deixou:
“No primeiro domingo de
setembro, eu estava só em casa com mamãe. Ela estava sentada, tricotando perto
da janela. Eu estava ao pé dela. De repente, ela me fez a pergunta tanto tempo
esperada:
- O que vais fazer em Colônia, com as religiosas?
- Viver com elas! - respondi
“Mamãe não parou de tricotar. Seu novelo de lã se desenrolou. Com as mãos
trêmulas, procurou ajeitá-lo. Eu ajudei, enquanto a nossa conversa continuava.
Desde este momento a paz tinha terminado. Sobre a casa, pairava uma pesada
pressão. De tempos em tempos mamãe me fazia uma pergunta ou outra. Seguia-se um
silêncio. Meus irmãos pensavam como minha mãe, mas não desejavam aumentar seu
sofrimento. Um de seus genros, contudo, mostrou-lhe que a minha decisão
consumaria a minha ruptura com o povo judeu justamente quando se aproximavam
terríveis provações. Como esta alusão a minha infidelidade deve ter feito
sofrer minha mãe!”
“Ela que aceitava com o coração tão leve a Cruz que se abatia sobre sua
raça, e que desejava carregar diante de Deus! A separação me foi tão cruel, que
ninguém poderia me dizer com certeza, se tal ou qual maneira de agir teria sido
a melhor. Eu tinha que dar este passo nos mistérios da fé. Muitas vezes,
durante estes dias, pensei: Qual de nós duas, mamãe ou eu, não saberá mais
resistir?
“Mas nós ambas agüentamos até o último dia.”
A 12 de outubro, aniversário de Edith e, ao mesmo tempo, festa judia dos
Tabernáculos a jovem acompanhou, uma vez mais, sua mãe à sinagoga. Durante o
longo trajeto de volta que sua velha mãe queria fazer a pé, a fim de abrir o
coração com a filha, ela lhe perguntou:
- O sermão não foi belo?
- Certamente mamãe!
- Então também se pode ser piedosa entre os judeus?
- Por certo, se não se aprendeu a conhecer outra coisa.” Ela teve então esta dolorosa reflexão:
- Porque então aprendeste a conhecer outra coisa? Eu não quero reprovar nada a
Jesus. Ele pode ter sido uma criatura muito bondosa. Mas por que ele quis se
fazer Deus?
“Neste dia havia muita gente em nossa casa. Um após outro nossos hóspedes se
despediram. Por fim eu fiquei só, com mamãe. Com as mãos no rosto, ela começou
a chorar. Eu me coloquei atrás de sua cadeira e abracei docemente esta
venerável cabeça branca. Assim ficamos longo tempo, até que ela quis se deitar.
Nesta noite, não fechamos os olhos nem por um momento.”
No dia seguinte pela manhã Edith Stein partiu para Colônia, e, dois dias depois
encontrava-se diante desta clausura que há tanto tempo desejava transpor.
A 15 de outubro de 1933, com 42 anos de idade, Edith Stein terminava o estranho
itinerário que a conduzira de Husserl ao Carmelo. Daí em diante, começava uma
nova estrada. A estrada da irmã Teresa-Benedita da Cruz. Este foi o nome
religioso que tornou, a 15 de abril de 1934, ao receber o hábito. No dia
seguinte a esta cerimônia, o provincial dos Carmelitas pediu-lhe que retomasse
daí por diante, em seu tempo livre, seu trabalho científico de filosofia.
Apesar do isolamento do claustro, ela continuava em comunicação com a sua
família. Cada semana, por uma permissão especial, enviava uma carta a sua mãe.
Por muito tempo suas cartas não tiveram resposta. Afinal, recebeu uma carta,
testemunha do amor materno enfim vencedor. A partir deste momento, as cartas de
sua irmã Rosa traziam-lhe de cada vez algumas palavras de sua mãe. Durante o
verão de 1936, mulher admirável, com 87 anos de idade, caiu doente e seu estado
piorou rapidamente. A 14 de setembro, na festa de Exaltação da Santa Cruz,
fazia-se no Carmelo a cerimônia de renovação dos votos. Quando chegou a vez da
irmã Tereza da Cruz, ela teve de súbito a clara intuição: “Minha mãe está ao meu lado”. No mesmo dia, um
telegrama trouxe a noticia do falecimento. Sua mãe tinha expirado na hora da
renovação de seus votos.
Durante o Advento de 1936, Edith Stein teve a alegria de acolher sua irmã Rosa
que recebeu afinal o batismo, tanto tempo retardado para não ferir ainda mais a
velha mãe.
O céu cobria de nuvens cada vez mais sombrias. A perseguição nazista, longe de
diminuir, redobrava de violência. Era uma pérfida campanha contra a religião de
um modo geral, e contra as ordens religiosas em particular. A irmã Teresa temia
que a sua presença expusesse o Carmelo de Colônia a represálias. Assim, a sua
partida para a Holanda foi decidida.
Santa Teresa Benedita da Cruz e sua irmã Rosa |
Nesta época, sua irmã Rosa veio encontrá-la no Carmelo de Echt, como carmelita
de terceiro grau.
O HOLOCAUSTO
10 de maio de 1940. Em meio ao fragor das explosões e ao rugir dos motores, a
possante máquina de guerra nazista se põe em marcha. A Holanda é rapidamente
ocupada. As perseguições anti-semitas desenvolvem-se com violência.
Um perigo imediato pesa, de novo, sobre a irmã Teresa da Cruz. Por isto, é
decidida uma nova evasão para a Suíça, para o Carmelo Le Pâquier, perto de
Friburgo.
Era o começo de 1942. As formalidades burocráticas se alongavam. Uma convocação
da Gestapo já chamara a religiosa a Maestricht e depois a Amsterdam. A sua
presença não tinha escapado à sinistra polícia. As ameaças se faziam cada vez
mais temíveis. Felizmente, tudo estava pronto para a partida... Mas não eram
estes os desígnios de Deus.
A 2 de agosto de 1942, a comunidade de Echt tinha se dirigido ao coro, como de
costume, para a oração matinal. Bateram na porta do convento. Dois oficiais
apareceram e solicitaram a presença das irmãs Stein. Estas, supondo que lhes
traziam o passaporte para a Suíça, deixaram a capela.
Ao entrar no parlatório, empalideceram. Os SS as esperavam. Tiveram ordem de se
aprontar para deixar o Carmelo em dez minutos.
Edith Stein voltou ao coro, ajoelhou-se uma última vez diante do Santíssimo
Sacramento e deixou a comunidade, com estas palavras:
“Por favor, irmãs, rezem por nós.”
Os enérgicos protestos da Madre Superiora não tiveram nenhum efeito.
Rapidamente as duas religiosas reuniram o que lhes permitiram levar: uma
coberta, uma caneca, uma colher e algumas provisões.
Na rua, onde uma multidão se tinha reunido para protestar, estava um grupo dos
SS. Fizeram entrar as duas irmãs em uma viatura que partiu para um destino
desconhecido.
Em Echt, onde a angústia reinava, recebeu-se um telegrama do campo de
concentração de Amersfort. Edith Stein pedia algumas vestes quentes e seu
breviário.
As irmãs enviaram rapidamente a sua encomenda, por intermédio de jovens
holandeses que puderam entrar em comunicação com as duas religiosas. Eles as
encontraram muito calmas, sem a menor queixa, mas na incerteza total de seu
futuro. Uma carta recebida pouco depois, anunciava a sua partida iminente para
leste. Veio ainda uma palavra, última confidência que brilhou como uma última
chama na noite: A ciência da Cruz não
se pode adquirir sem que ela nos pese realmente sobre os ombros. Desde o
primeiro instante eu estava convencida, e a mim mesma me dizia: Ave crux, spes
unica...
O silêncio total se seguiu. Soube-se que a 6 de agosto, primeira quinta-feira do
mês, um
comboio de judeus, quase todos convertidos, tinha partido em direção da
Polônia.
O último traço conhecido desta eminente religiosa é um pequeno bilhete a lápis
remetido por mão desconhecida a uma irmã de Friburgo: A caminho da Polônia.
Lembranças
da Irmã Teresa Benedita da Cruz.
E, após, a noite. Ignoramos onde terminou o seu calvário. Não se sabe em que
lugar este olhar profundo que tinha perscrutado sempre os enigmas do homem e do
universo, encontrou afinal a luz sem sombras.
Alguns disseram, com certo fundamento ao que parece, que foi nas câmaras de gás
do sinistro campo de extermínio de Auschwitz, na Polônia. Mas nada foi confirmado
oficialmente. Por que então perseguir questões sem utilidade?
“Nós não a procuramos mais na terra, escreviam as Carmelitas de Colônia, mas perto de Deus que
aceitou seu sacrifício e dará a recompensa ao povo pelo qual ela sofreu e
morreu.”
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