Entraram os frades menores
em Portugal pelo ano de 1216, demandando logo a corte do rei Dom Afonso II, que
residia em Coimbra. Foi, então, grande a afeição que lhes tomou a rainha Dona
Urraca, sua mulher, que os adotou por filhos, e os mandou abrigar com exímia
caridade. Daí passaram para a vila de Alenquer. Pela fama já divulgada de suas
virtudes e do seu zelo pelo bem espiritual das almas, recebeu-os em Alenquer a
infante Dona Sancha, com muita piedade e devoção, e, desejando muito que ali
ficassem, deu-lhes um lugar para a fundação de um convento.
No capítulo (sala onde se
reúnem os religiosos para deliberar sobre negócios de sua jurisdição; essas
reuniões chamam-se “capítulos”, daí o nome da sala) deste convento se venera,
desde a sua fundação, uma milagrosa imagem de Nossa Senhora, à qual se refere a
seguinte maravilha:
Houve nesse convento um
noviço de vida muito inocente, ao qual o guardião ordenou certo dia, em
penitência de leve culpa, que não se apartasse do altar de Nossa Senhora
enquanto ela mesma não lhe revelasse que oração lhe era mais aceita dentre
todas as que lhe eram dirigidas.
O santo noviço perseverou de
joelhos todo o dia, e, sendo já alta noite, do profundo da alma, com grande
afeto, devoção e lágrimas, prorrompeu nestas palavras:
“Ó Virgem Santíssima, Mãe de Piedade, humildemente vos
rogo, manifesteis a esse vosso servo o que o guardião me mandou perguntar-vos.
Por obediência, Mãe Santa, daqui não hei de me afastar sem lhe levar a
resposta.”
Eis que, inclinada a imagem
de Nossa Senhora, a seus humildes rogos, do altar onde estava lhe responde:
“Vai, amantíssimo filho, e afirma que o hino ‘O gloriosa
Domina’, que a Igreja me canta, é de todas as orações a que me é mais aceita,
e, para provar o que te digo, este meu Infante Jesus, que até agora tive no
braço direito, eu o passo para o esquerdo, por isso, vai confiante, que, vendo
o mundo tão extraordinária maravilha, todo ele te dará crédito; e convida o
guardião e os mais religiosos para virem me visitar”.
O santo noviço, consolado
com tão grande favor, depois de agradecer a Nossa Senhora, foi obediente
referi-lo ao guardião, que, alvoroçado, assim como os outros religiosos, foram
todos, e, vendo o tão manifesto milagre que Nossa Senhora havia operado em sua
santa imagem, creram no que o noviço afirmava da oração “O Gloriosa Domina”,
crescendo nos fiéis, daquele dia em diante, a devoção a Nossa Senhora, que
ainda hoje persevera.
Conservou-se sempre o Menino
mudado, sendo evidentíssimos testemunhos da verdade deste sucesso os sinais que
ficaram no lugar em que tinha estado o Menino. Sucedeu este prodígio no ano de
1224, e, para comemorá-lo, todos os sábados, depois das Completas, tocado o
sino grande, vai a comunidade em procissão ao capítulo, com círios acesos,
acompanhada de multidão, e, com solenidade e devoção, de joelhos cantam o hino “O Gloriosa Domina”.
Parece que foi deste fato
que nasceu, em nosso Santo Antonio de Lisboa, a grande devoção que tinha a esse
hino, valendo-se dele em suas maiores necessidades, como fez certa noite em que
o demônio quis afogá-lo, invejoso do grande fruto que produzia na Itália a sua
pregação, afugentando-o com a repetição deste hino. Este milagre é referido por
todos os autores franciscanos.
Como a imagem milagrosa
estava na sala do capítulo, deram a Nossa Senhora o novo título: Nossa
Senhora do Capítulo.
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