sábado, 28 de março de 2020

Querida Amazônia: A convivência ecumênica e inter-religiosa – nºs 106 a 110


Numa Amazônia plurirreligiosa, os crentes precisam de encontrar espaços para dialogar e atuar juntos pelo bem comum e a promoção dos mais pobres. Não se trata de nos tornarmos todos mais volúveis nem de escondermos as convicções próprias que nos apaixonam, para podermos encontrar-nos com outros que pensam de maneira diferente. Se uma pessoa acredita que o Espírito Santo pode agir no diverso, então procurará deixar-se enriquecer com essa luz, mas acolhê-la-á a partir de dentro das suas próprias convicções e da sua própria identidade. Com efeito, quanto mais profunda, sólida e rica for uma identidade, mais enriquecerá os outros com a sua contribuição específica.

Nós, católicos, possuímos um tesouro nas Escrituras Sagradas que outras religiões não aceitam, embora às vezes sejam capazes de as ler com interesse e inclusive apreciar alguns dos seus conteúdos. Algo semelhante, procuramos nós fazer face aos textos sagrados doutras religiões e comunidades religiosas, onde se encontram preceitos e doutrinas que (…) refletem não raramente um raio da verdade que ilumina todos os homens. Temos também uma grande riqueza nos sete Sacramentos, que algumas comunidades cristãs não aceitam na sua totalidade ou com idêntico sentido. Ao mesmo tempo que acreditamos firmemente em Jesus como único Redentor do mundo, cultivamos uma profunda devoção à sua Mãe. Embora saibamos que isto não se verifica em todas as confissões cristãs, sentimos o dever de comunicar à Amazônia a riqueza deste ardente amor materno, do qual nos sentimos depositários. De fato, terminarei esta Exortação com algumas palavras dirigidas a Maria.

Nada disto teria que nos tornar inimigos. Num verdadeiro espírito de diálogo, nutre-se a capacidade de entender o sentido daquilo que o outro diz e faz, embora não se possa assumi-lo como uma convicção própria. Deste modo torna-se possível ser sincero, sem dissimular o que acreditamos, nem deixar de dialogar, procurar pontos de contacto e sobretudo trabalhar e lutar juntos pelo bem da Amazônia. A força do que une a todos os cristãos tem um valor imenso. Prestamos tanta atenção ao que nos divide que, às vezes, já não apreciamos nem valorizamos o que nos une. E isto que nos une é o que nos permite estar no mundo sem sermos devorados pela imanência terrena, o vazio espiritual, o cómodo egocentrismo, o individualismo consumista e autodestrutivo.

Como cristãos, a todos nos une a fé em Deus, o Pai que nos dá a vida e tanto nos ama. Une-nos a fé em Jesus Cristo, o único Redentor, que nos libertou com o seu bendito sangue e a sua ressurreição gloriosa. Une-nos o desejo da sua Palavra, que guia os nossos passos. Une-nos o fogo do Espírito que nos impele para a missão. Une-nos o mandamento novo que Jesus nos deixou, a busca duma civilização do amor, a paixão pelo Reino que o Senhor nos chama a construir com Ele. Une-nos a luta pela paz e a justiça. Une-nos a convicção de que nem tudo acaba nesta vida, mas estamos chamados para a festa celeste, onde Deus enxugará as nossas lágrimas e recolherá o que tivermos feito pelos que sofrem.

Tudo isto nos une. Como não lutar juntos? Como não rezar juntos e trabalhar lado a lado para defender os pobres da Amazônia, mostrar o rosto santo do Senhor e cuidar da sua obra criadora?

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