Vínculo entre os Apóstolos e os
Padres da Igreja, seguidor do "discípulo amado", incansável
combatente contra as heresias, mártir sereno e corajoso: eis alguns traços da
rica personalidade daquele que foi um dos maiores bispos dos primeiros tempos, São Policarpo, converteu-se
ao cristianismo no ano de 80, e teve a grande honra de ter sido discípulo do
grande Apóstolo São João Evangelista, de quem recebeu o espírito e a doutrina
de Jesus Cristo.
Em 96 recebeu a sagração
episcopal e foi-lhe confiada a diocese de Esmirna. É possível que São João
Evangelista no livro Apocalipse tenha-se referido a Policarpo quando escreveu:
“Sei tua tribulação e pobreza, porém, és rico”, e mais adiante: “Se fiel até a
morte e dar-te-ei a coroa da vida”. (Apoc. 2, 9.).
O santo Bispo-mártir de
Antioquia Inácio, alegrou-se muito com a visita de Policarpo, e escreveu duas
epístolas importantes, uma a Policarpo e outra aos fiéis de Esmirna, em que lhe
dá sábios ensinamentos sobre a santa doutrina.
Policarpo administrou a
diocese como verdadeiro Apóstolo, com firmeza e caridade, pela palavra e pelo
exemplo. De sua autoria existe uma epístola preciosíssima
aos Filipenses, cheia do mais belos ensinamentos e sábios conselhos.
Já idoso, fez uma viagem a
Roma, para tratar com o Papa Aniceto sobre
a célebre questão da Páscoa. Em Roma encontrou muitos cristãos, que se tinham
deixado enganar pelos hereges Valentim e Marcion, e conduziu-os ao caminho da
verdade.
Por Marcion perguntado,
se o conhecia, respondeu prontamente, que o conhecia, o filho mais
velho de Satanás.
De volta para a Ásia,
encontrou na diocese o decreto de perseguição, publicado pelo imperador Marco
Aurélio.
Foi o princípio de horrores
para a jovem Igreja. O governador de Esmirna começou a perseguição, pela
condenação de doze cristãos, que foram atirados às feras. Policarpo, vendo o
rebanho em perigo, redobrou os esforços para conservá-lo na fé e confortá-lo na
hora da tribulação. Os cristãos, por seu turno, inquietavam-se muito pela sorte
do venerável Bispo. Para salvar-lhe a vida, levaram-no a um sítio fora da
cidade, onde o esconderam aos olhos dos fiscais do governo.
Três dias antes da sua
prisão teve a revelação do martírio que o esperava. Em sonhos viu o travesseiro
rodeado de fogo e disse aos amigos: “Meus irmãos, sei que serei
condenado à morte pelo fogo. Deus seja bendito, porque se digna de dar-me a
coroa do martírio”. Três dias depois se cumpriu o que tinha predito.
A polícia do governador
descobriu-lhe o esconderijo e Policarpo, embora lhe fosse fácil efetuar a fuga,
entregou-se à autoridade. No caminho para a cidade se encontrou com Herodes,
juiz de paz e com Nicetas, pai do mesmo. Estes homens, sem dúvida bem
intencionados, insistiram com ele para que conservasse a vida e obedecesse à
lei do imperador. Depois de muito discursar, o Bispo disse: “Não farei o que
me aconselhais. Nem espada, nem fogo ou qualquer outra tortura, me fará
renunciar a Cristo”.
Apresentado ao governador,
este lhe perguntou se era Policarpo e ordenou-lhe que abjurasse a religião e
injuriasse a Cristo. Policarpo respondeu: “Sim, sou Policarpo. Oitenta e
seis anos são que completo no serviço de Jesus Cristo e Ele nunca me fez mal
algum; como poderia injuriá-lo?”
O governador, porém,
continuou a insistir com muito empenho e disse: “Tenho as feras à minha
disposição; se não obedeceres, serás atirado a elas!”
Policarpo: “Deixa-as
vir! Persisto no meu intento e não mudarei!”
O governador: “Se não
tens medo das feras, temos ainda o fogo; este te porá manso!”
Policarpo: “Ameaças com
um fogo que arde por algum tempo, para depois se apagar e nada sabes daquele
fogo eterno, que é preparado para os ímpios. Não percas tempo! Manda
vir as feras ou faze o que quiseres. Sou cristão e não abandonarei a Cristo”.
Em dizer isto, o rosto
resplandecia-lhe de satisfação, tanto que todos se admiraram, sem poder
compreender, como um homem tão avançado em idade pudesse apresentar tamanho
heroísmo.
O governador mandou apregoar
em alta voz: “Policarpo é cristão, como ele mesmo confessou”. Os judeus e
pagãos presentes unânimes exigiram sentença de morte e pediram que fosse
queimado vivo. Em poucos minutos foi preparada a fogueira. Alguns queriam que o
Santo fosse amarrado num pau, para impossibilitar a fuga. Policarpo, porém,
tranqüilizou-os, dizendo: “Aquele que me dá a graça de sofrer a pena do fogo,
há de dar-me também força para que fique imóvel no meio das labaredas”. Ataram-lhe
então as mãos nas costas e puseram fogo.
Antes que o fogo chegasse a
queimar-lhe o corpo venerável, o ancião elevou os olhos ao céu e disse: “Deus
todo-poderoso, Pai de Jesus Cristo, vosso Filho Unigênito, por quem recebemos a
graça de conhecer-Vos; Deus dos Anjos e das Potestades celestiais, Deus de
todas as criaturas e de todo o povo dos justos, que vivem em vossa presença:
graças vos dou porque me conservastes a vida até esta hora, para ser associado
aos vossos mártires e participar do cálice de amargura do vosso Ungido, e na
virtude do Espírito Santo ser ressuscitado para a vida eterna. Aceitei
propício, em união àquele sacrifício que para vós preparastes, este meu
holocausto e a mim mesmo, para que se cumpra o que me revelastes, Vós que sois
Deus verdadeiro. Eu vos louvo em todas as coisas: eu vos bendigo; eu vos
glorifico, pelo eterno Sumo Pontífice, Jesus Cristo, vosso dileto Filho, que
convosco e o Espírito Santo é louvado e honrado por todos os séculos. Amém”.
Apenas tinha o Santo
terminado a oração, quando subiram as labaredas com todo o vigor. Deus, porém,
quis manifestar o seu poder e provar que não lhe faltavam os meios de proteger
seu servo no meio do fogo. As chamas subiram de todos os lados, mas – ó
maravilha! – formaram como que uma abóbada por cima do Santo, sem que lhe
queimassem um só cabelo. Ao mesmo tempo se espalhou um cheiro suavíssimo como
se fossem queimados doces perfumes. Pavor apoderou-se dos inimigos. Mas, como
quisessem ver morto o servo de Cristo, recebeu o algoz a ordem de matá-lo com a
espada. Assim terminou o curso glorioso do grande Bispo que, segundo a
afirmação dos judeus e pagãos, tinha sido o primeiro mestre dos cristãos e o
inimigo mais implacável dos deuses.
“Tiramos das cinzas os ossos, para nós mais preciosos que ouro e
pedrarias, e depositamos num lugar conveniente, onde esperamos poder, com a
graça de Deus, reuni-los, para festejar o dia do seu aniversário, isto é, o dia
dos seu martírio”, que foi o dia 26 de janeiro de 155 ou 156. O túmulo de São
Policarpo acha-se numa capela em Esmirna.
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