terça-feira, 1 de agosto de 2017

Agosto - Mês Vocacional

São Bernardo de Claraval: Caçador de Almas e Vocações

Celebramos no dia 20 de agosto a memória de São Bernardo de Claraval, que nos inspira considerar alguns aspectos de sua vida, especialmente no que diz respeito à sua vocação e seu trabalho com outros jovens por ele atraídos à vida monástica. Será interessante, neste mês vocacional, aprofundarmos um pouco a /missão desse abade cisterciense que tanto cativou jovens vocacionados para a vida monástica, tornando-se um mito no seu tempo.

Bernardo se sente chamado para uma vida diferente. Sua mãe acaba de morrer e dela recebeu ele o gosto pelo estudo e pela meditação. Durante certo tempo, hesita, sentindo-se sujeito a algumas tentações. A primeira proposta que lhe veio à mente foi a de estudar na Alemanha. Chegou a partir, mas, no caminho, lembrou-se de sua mãe, recém-falecida, entrou em uma igreja e ali rezou. Não só a ausência daquela que o trouxe ao mundo lhe preocupava, mas também a situação em que se encontrava a face humana de sua mãe espiritual, a Igreja que o gerou para a vida divina pelo Santo Batismo. Ele via a Igreja “muito comprometida com os assuntos do mundo secular, demasiados discursos, exageros de novidades e de dinheiro; era preciso buscar de novo o silêncio para encontrar a Deus”.

Aquele jovem que aspirava a vida autêntica mudou, então, de rumo e foi para Borgonha, região cheia de mosteiros beneditinos, dentre os quais está Cluny, tido como “um império temporal e também espiritual”. No entanto, não é essa glória que deixava Bernardo extasiado. O que ele queria era apenas a glória de Deus para sua vida. Importava-lhe amar e servir ao Senhor como Ele deseja ser amado e servido. Nem mais, nem menos.

Com esse nobre intento, Bernardo procurou o assim chamado “novo mosteiro” que tem o nome de Citêaux e localizava-se em uma região de brejo e junco, propícia ao cultivo dos próprios alimentos dos monges. Ali os religiosos viviam (e vivem) “a pobreza, o silêncio e a oração”, se vestiam com simples hábitos de lã sem estampas, dormiam em colchões de palhas, alimentavam-se do que colhiam em suas férteis terras e – o mais importante para o espírito – rezavam (e rezam) sete vezes ao dia o Ofício Divino.

Todavia, Bernardo, bastante ponderado, não entrou logo para o mosteiro. Queria e, talvez, precisaria aprender a viver a vida comunitária pobre e desprendida de Citêaux, ou fazer uma experiência para ver se conseguiria sustentá-la até o fim. Veio-lhe uma ideia brilhante: reunir cerca de 30 pessoas, incluindo familiares e amigos, que tinham o mesmo desejo que ele para morarem juntos, em uma casa em Châtillon-sur-Seine, antes de pedir admissão à vida monástica.

No ano de 1113, já bem amadurecido, Bernardo pediu e foi acolhido junto com seus familiares e amigos homens no mosteiro de Citêaux, mas, apesar da experiência familiar anterior em comum, a vida ali não lhe seria fácil. A natureza, porém, muito o ajudava na contemplação, como ele mesmo confessa ao escrever: “Tu encontrarás mais coisas nas florestas do que nos livros; as árvores e as pedras te ensinarão mais do que qualquer mestre te poderá dizer”. O espírito contemplativo de Bernardo o fazia passar todo o período de noviciado absorto em Deus, de modo que nem prestava atenção ao que à sua volta pudesse distraí-lo da meta almejada: buscar ao Senhor na simplicidade, no silêncio e, sobretudo, na oração do Ofício e na meditação da Sagrada Escritura pela Lectio Divina, aspectos centrais da vida monástica cisterciense.

No ano de 1115, Bernardo foi ordenado sacerdote e mandado por Santo Estêvão Harding, na época o novo superior do mosteiro, com outros doze monges, seus parentes e amigos que com ele entraram em Citêaux, para fundarem o mosteiro de Claraval (Clairvaux), o Vale Luminoso.
Mas por que a escolha do local? – Porque um vale isolado e percorrido por um córrego facilitava a ascese, a penitência, a oração e o trabalho de cultivo do campo para o próprio sustento. Providencia-se a construção de alguns casebres de madeira, a cela do abade e uma capela de alvenaria. Bernardo se instala numa cela exígua. Ele tinha o desejo de acolher bem a todos os que ali chegavam para uma experiência monástica. Não importa se traziam ou não uma carta de recomendação de seus respectivos Abades. Para ele o que mais importa era a pessoa que chegou, ávida de melhor servir a Deus na liberdade de sua consciência.

O mosteiro de Claraval se enchia de vocações, seja porque muitos procuravam Bernardo, seja porque eram por ele procurados.
Ao  sair de viagem, Bernardo fazia pregações e sempre atraía muitos jovens ou adultos para o glorioso mosteiro, de modo que seu biógrafo “encontrou oitocentas e noventa cartas de promessas de monges que tinham vindo a Claraval, sem contar os irmãos, leigos e conversos, esses camponeses nas granjas que ajudavam os monges de coro a trabalhar os campos”.

A atração mais estrondosa foi a de Henrique de França, irmão do Rei Luís VII. Esse príncipe foi a Claraval tratar de um importante assunto com São Bernardo. Quando ia sair, pediu para ver todos os monges, a fim de se recomendar às suas orações. Bernardo disse-lhe que logo experimentaria a eficácia dessas orações. No mesmo dia, Henrique sentiu-se tão tocado pela graça que, esquecendo-se de que era então o sucessor da coroa, quis ficar em Claraval. Mais tarde foi Bispo de Beauvais, e depois Arcebispo de Reims.

Diz-se, inclusive, que, ao saberem que o santo iria passar por uma região, as mulheres cuidavam de trancar em casa seus filhos e maridos, com medo que abandonassem tudo e seguissem Bernardo, tamanho era seu poder de persuasão ao falar do Reino de Deus e da vida monástica.

No fim de sua vida terrena, declarou: “Subi à parte superior de mim mesmo e ainda mais alto reina o Verbo Explorador. Curioso que sou, desci ao fundo de mim mesmo e o encontrei ainda mais baixo. Olhei para fora e o percebi no além de tudo. Olhei para dentro, e pareceu-me muito mais íntimo do que eu mesmo. Quando ele entra em mim, o Verbo não trai sua presença por nenhuma sensação. É somente o secreto estremecimento do meu coração que o patenteia. Meus vícios fogem, minhas afeições carnais são dominadas, minha alma se transforma, o homem interior se renova, e em mim está como que a sombra de seu Esplendor”.

São Bernardo, no dia 20 de agosto de 1153, em sua querida Claraval, cercado de seus monges, entregou sua alma a Deus. Já em 1174, decorridos apenas vinte anos de sua morte, o papa Alexandre III o proclamou santo.
Possa o belo exemplo de São Bernardo de Claraval inspirar muitas e santas vocações à Igreja de nossos dias, não só à vida monástica, mas a outros gêneros de vida consagrada, cujo testemunho o mundo muito necessita. Que tenhamos a autenticidade e o entusiasmo de Bernardo de Claraval a propor aos jovens de hoje a alegria da entrega a Deus no serviço aos irmãos e irmãs.
Cardeal Orani João Tempesta


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