O dia 10 de setembro de 1946 ficou marcado na
história das Missionárias da Caridade e, obviamente, no livro da vida da Madre
Teresa como o "dia da inspiração". Numa viagem de trem ao noviciado
do Himalaia, recebe uma claríssima iluminação interior: dedicar a sua vida aos
mais pobres dos pobres. Relatou-o assim:
"Em 1946, ia de Calcutá a Darjeeling, de trem,
para fazer o meu retiro. Nunca é fácil dormir nos trens, mas tentar fazê-lo num
trem da Índia é impossível: tudo range, há um penetrante odor de sujidade pelo
amontoamento de homens e animais, todo um detrito de humanidade, cestos,
galinhas cacarejando... Naquele trem, aos meus trinta e seis anos, percebi no
meu interior uma chamada para que renunciasse a tudo e seguisse Cristo no
subúrbios, a fim de servi-lo entre os mais pobres dos pobres. Compreendi que
Deus desejava isso de mim..."
Irmã Teresa pensava nos pobres de Calcutá que todas
noites morrem pelas ruas e que na manhã seguinte, são lançados para o carro da
limpeza como se fossem lixo. Não! Ela não conseguia habituar-se a esse terrível
espetáculo de pessoas esqueléticas morrendo de fome ou pedindo esmola pelas
ruas.
A longa e dolorosa meditação que fizera terminou
com uma pergunta muito concreta: que poderei fazer por estes infelizes? Aqui a
angústia da sua alma cresceu. Amava a Congregação, gostava de ensinar... quase
nada poderia fazer dentro dos regulamentos a que amorosamente se sujeitara e
que cumprira com toda a fidelidade. Mas Deus não pediria mais? Não seria talvez
necessários ir ter com as superioras e com as autoridades eclesiásticas e
expor-lhes frontalmente o problema, pedir-lhes até autorização para fazer a
experiência de se colocar totalmente ao serviço dos mais pobres?
Foi assim, com todas estas interrogações que a Irmã
Teresa viveu o seu retiro daquele ano. Na oração e na meditação daqueles dias,
mais se confirmou que a aspiração que lhe brotava do fundo da alma não era um
capricho mas manifestação da vontade de Deus.
Tendo regressado a Calcutá, foi ter com o arcebispo
Mons. Fernando Périer a quem expôs o seu plano. Ele ouviu atentamente e, no
fim, calmo, frio, disse um não absoluto que não deixou hipóteses para qualquer
dúvida.
A Irmã Teresa aceitou humildemente a recusa. Mais
tarde comentá-la-á assim: "Não podia ter sido outra a sua resposta. Um
bispo não pode autorizar a primeira religiosa que se lhe apresenta com projetos
raros sob pretexto de que essa parece ser a vontade de Deus"
Voltou às lides diárias que cumpria cada vez com
maior dedicação e entusiasmo. O carinho das alunas demonstrado de tantas
maneiras e a amizade das companheiras não lhe fizeram esquecer a imagem
horrorosa dos doentes e dos famintos que morriam pelas ruas de Calcutá. Mas por
vezes, apresentava-se-lhe angustiosa esta pergunta: não será tudo isto uma
tentação do demônio?
Um ano depois, foi ter novamente com o arcebispo.
Levava nos lábios o mesmo pedido e no coração a mesma disposição para aceitar,
com humildade e alegria, a resposta qualquer que ela fosse. Mons. Périer
escutou, mais uma vez, as razões da Ir. Teresa. A sua simplicidade, fervor e
persistência convenceram-no de que estava perante uma manifestação da vontade
de Deus. Por isso, desta vez, mais afável, aconselhou:
- Peça primeiro autorização à Madre Superiora.
A Irmã Teresa escreveu prontamente uma carta
expondo o seu plano. A Superiora viu nessas linhas a expressão da vontade de
Deus. O que aquela religiosa pedia era algo muito sério e exigente. Por isso,
respondeu-lhe nestes termos: "Se essa é a vontade de Deus, autorizo-te de
todo o coração. De qualquer maneira, lembra-te sempre da amizade que todas nós
te consagramos. Se algum dia, por qualquer razão, quiseres voltar para o meio
de nós, fica sabendo que te receberemos com amor de irmãs."
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