Canonizada em 1461 por Pio II, Caterina di Iacopo di Benincasa, que não tinha
aprendido a ler nem a escrever, foi em 4 de outubro de 1970, solenemente
proclamada doutora da Igreja por Paulo VI.
Catarina era a vigésima
terceira de uma família de vinte e cinco irmãos. Nasceu em 25 de março de 1347, em Sena, na Itália. Seu pai Iacopo,era um homem piedoso e caridoso…Lapa,
era excelente mãe. Amava os filhos com fervor e ternura: a perfeita mamma
popular, à italiana. Na velhice, a exemplo da filha Catarina, tornou-se
terciária dominicana.
Quando Catarina tinha seis anos, voltava com o irmão Stefano da casa da irmã
mais velha, Bonaventura. As duas crianças subiam a ladeira, a Valle Piata,
erguendo os olhos para o cimo da Igreja de São Domingos, dos irmãos pregadores,
a menina de repente viu diante de si “suspenso no ar, um trono de grande
beleza, ornado com uma magnificência majestosa. Nesse trono, como um imperador
ornamentado à maneira pontifical, tiara na cabeça, estava sentado o Senhor
Jesus Cristo, Salvador do mundo. Perto dele estava Pedro, o príncipe dos
apóstolos, Paulo e o santo evangelista João.”
Diante dessa visão, a menina
ficou como que grudada ao solo, olhar fixo, olhando amorosamente seu Salvador e
Senhor, que para mostrar seu amor assim se mostrava. Com os olhos fixados na
menina, olhos cheios de majestade, e com um sorriso doce, ele ergueu a mão
direita e, fazendo o sinal da cruz, como fazem os prelados, concedeu-lhes o dom
de sua benção eterna.
Tomada de um zelo ainda
infantil, ela saiu pela porta de Sant’ Ansano, refugiou-se em uma gruta e
pôs-se a rezar com fervor; ei-la a erguer-se “lentamente no ar, até a altura
máxima permitida pela gruta”, para assim permanecer até cerca de três horas da
tarde.
Catarina tinha então sete
anos (1354). Seu espírito amadurecera. Já nesta altura, quando tomava uma
decisão, nada detinha sua vontade. Sua vocação se afirmava. Para não mais
recuar, precisava engajar-se para sempre. Certo dia, em um lugar retirado, ela
se ajoelhou, instalou um longo silêncio no coração e, em seguida, em voz alta,
dirigindo-se à Virgem Maria, pronunciou as seguintes palavras:
“Bem-aventurada e Santa
Virgem, vós que sois a primeira entre todas as mulheres, que consagrastes
perpetuamente vossa Virgindade ao Senhor, por graça de quem vos tornastes a Mãe
de seu único Filho, suplico vossa incomparável clemência que, sem olhar meus
méritos nem minha indignidade, dignai-vos conceder-me a imensa graça de me dar
por Esposo Aquele que desejo com todas as forças da minha alma, vosso Santíssimo
Filho, o único Senhor, Jesus Cristo. Eu vos prometo, a ele e a vós, jamais
escolher nenhum outro esposo e tudo fazer para conservar intacta minha pureza.”
Depois deste voto, tudo
passou a indicar o progresso feito por Catarina na via da santidade, a fim de
preservar a pureza de seu corpo e de seu espírito. Seu pendor para a
mortificação acentuou-se a tal ponto que atingiu proporções inquietantes: a
recusa em comer carne (disfarçadamente ela repassava os pedaços a seu irmão
Stefano, ou jogava-se para os gatos); as flagelações, sozinha ou com as
amiguinhas; o interesse intenso pela severidade da ascese dos santos famosos.
Catarina guardava, porém, em
segredo o voto de consagrar sua vida a Deus. Tinha então treze anos.
A morte de sua irmã Bonaventura
fez redobrar o empenho da família Benincasa em encontrar um marido para
Catarina. Catarina recusava categoricamente esse destino que, aos olhos das
pessoas ao redor, se impunha sem discussão a uma jovem que caminhava para seus
quinze anos.
O furor dos Benincasa
ultrapassou os limites. Reprovação, imprecações, insultos grosseiros,
sarcasmos, ameaças, insultos de todo tipo…. Assim, maltratada pelos seus, feita
de empregada, alvo constante de sarcasmos, Catarina, no frescor de sua
imaginação, teve uma ideia preciosa que a ajudou a suportar suas desgraças.
Transformada em serviçal
para todo tipo de tarefas, pôs-se na cabeça que seu pai representava Jesus
Cristo em pessoa, que sua mãe era a própria Maria, a gloriosa Mãe de Deus, e
que as demais pessoas de casa eram apóstolos e discípulos do Senhor. Desse
modo, ao servir a mesa, ela se imaginava servindo ao seu Divino Esposo,
enquanto, ao cozinhar, ocupava-se dos santos mistérios. Com isso ela fazia
reinar a alegria a si mesma e ao redor.
Um sonho lhe mostrou o caminho que se abria diante dela. São Domingos de Gusmão
apareceu-lhe em pessoa durante o sono. Tendo à mão um lírio de brancura
radiante e, dobrado sob o braço o hábito das Irmãs Dominicanas da Penitencia,
bastante numerosas então em Sena, ele lhe disse: “não deves temer nenhum
obstáculo, pois, segundo teu desejo, eu te asseguro que vestiras este habito.”
Diante de toda a família
reunida, Catarina revelou seu voto de virgindade e proclamou sua decisão
irrevogável de se entregar a Deus. Serva junto aos seus, até o fim de seus
dias, ou jogada à rua, se assim o quisessem, o Esposo “tão rico e poderoso” que
ela escolhera nunca a abandonaria.
Lapa estava horrorizada e
desesperada com isso. Suspirava, arranhava o rosto, arrancava os cabelos.
“Minha pobre filha”, gritava ela, “eu te vejo morta, vais acabar te matando,
não há a menor dúvida! Pobre de mim! Quem roubou minha filha?! Que fiz para
merecer tamanha desgraça?.
Aos
quinze anos, Catarina ingressou na Ordem Terceira de São Domingos. Durante as
orações contemplativas, envolvia-se em êxtase, de tal forma que só esse fato
possibilitou que convertesse centenas de almas durante a juventude. Já adulta e
atuante, começou por ditar cartas ao povo, orientando suas atitudes, convocando
para a caridade, o entendimento e a paz. Foi então que enfrentou a primeira
dificuldade que muitos achariam impossível de ser vencida: o cisma católico.
Dois papas disputavam o trono de Pedro, dividindo
a Igreja e fazendo sofrer a população católica em todo o mundo. Ela viajou por
toda a Itália e outros países, ditou cartas a reis, príncipes e governantes
católicos, cardeais e bispos, e conseguiu que o papa legítimo, Urbano VI,
retomasse sua posição e voltasse para Roma. Fazia setenta anos que o papado
estava em Avignon e não em Roma, e a Cúria sofria influências francesas.
Outra dificuldade, intransponível para muitos, que
enfrentou serenamente e com firmeza, foi a peste, que matou pelo menos um terço
da população européia. Ela tanto lutou pelos doentes, tantos curou com as
próprias mãos e orações, que converteu mais algumas centenas de pagãos. Suas
atitudes não deixaram de causar perplexidade em seus contemporâneos. Estava à
frente, muitos séculos, dos padrões de sua época, quando a participação da
mulher na Igreja era quase nula ou inexistente.
Em 1º de abril, um domingo
de Ramos, ela assistiu à missa celebrada por frei na Capela de Santa Cristina.
Depois da comunhão, entrou em êxtase. Seu corpo prostrado levantou-se aos
poucos, pôs-se de joelhos, os braços se abriram em cruz, o rosto se iluminou.
Permaneceu assim por muito tempo, retesada, de olhos fechados; em seguida, de
repente caiu como que ferida de morte, antes de recuperar logo depois as forças.
“Então”, prosseguiu frei Raimundo, ela me chamou e me disse em voz baixa: Saiba,
padre, que pela misericórdia do Senhor, levo no corpo esses estigmas. Vi o
Senhor pregado na cruz vir até mim em meio a uma grande luz. O arrebatamento da
minha alma, desejosa de ir ao Criador foi tamanho que meu corpo foi obrigado a
subir. Daí essas cicatrizes de suas santas chagas; vi descer na minha direção
cinco raios de sangue, dirigidos para minhas mãos, meus pés e meu coração.
Catarina
de Sena morreu no dia 29 de abril de 1380, após sofrer um derrame aos trinta e
três anos de idade. Depois de acusar de
suas faltas, Catarina recebeu a absolvição pela segunda vez em nome da
indulgência que lhe concedera o papa Urbano VI. Em seguida, rezou ardentemente,
olhos detidos no crucifixo, fazendo as últimas recomendações a seus discípulos.
Teve ainda forças para abençoar os que se encontravam ao redor, assim como
amigos que estavam ausentes. Em meio a suas últimas palavras retornou à imagem que
lhe era muito cara: o sangue, símbolo da graça do Cristo.
Barduccio Canigiani assim
relatou seus últimos instantes: “Assim ela chegava ao fim tão desejado, sempre
rezando.
E dizia: “Senhor, tu me
chamas para que eu vá a ti, e eu vou; por certo não por causa dos meus méritos,
mas graças somente a tua misericórdia. É ela que te peço em nome do sangue
dulcíssimo de teu Filho." E clamou várias vezes: “O sangue, o sangue”. Em
seguida, falando com grande doçura: “Pai, em tuas mãos coloco minha alma e meu
espírito… Era domingo, anterior à Ascensão, 29 de abril de 1380, por volta de
meio-dia.”
Sua
cabeça está em Sena, onde se mantém sua casa, e seu corpo está em Roma, na
Igreja de Santa Maria Sopra Minerva.
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