No domingo, 5 de
abril de 1252, dois frades dominicanos viajavam pela estrada que liga as cidade
de Como e Milão, na Itália. Enquanto caminhavam, iam rezando o Saltério. De
repente, saindo da mata, dois homens os atacaram, desferindo sobre um deles
terrível golpe de maça. O frade caiu por terra e, lentamente, molhando dois
dedos no próprio sangue, escreveu no chão: “CREDO”. Mal tinha acabado a
escrita, cravaram-lhe um punhal no coração. Morto o grande inimigo de sua seita
– seita dos cátaros ou maniqueus – os dois hereges lançaram-se sobre o outro
dominicano que, de joelhos, rezava, matando-o no mesmo instante.
Esses frades
assassinados tão barbaramente eram dois filhos espirituais de São
Domingos. Um deles, Pedro de Verona, o Inquisidor-mor de toda a Itália, era tão
grande pregador e polemista, que os hereges tinham sido obrigados a proibir
seus correligionários de ouvi-lo devido ao número de conversões; o outro era
seu companheiro, Frei Domingos.
São Pedro de
Verona tinha tal fama de santidade, que foi canonizado no mesmo ano de sua
morte.
Nada pode ser mais
favorável para a formação de um Santo do que um lar verdadeiramente cristão,
pois de uma árvore má não pode sair um bom fruto. Mas a Providência pode abrir
exceções a essa regra, e, muitas vezes abre. Foi o que sucedeu com São Pedro de
Verona, filho de pais hereges maniqueus.
Como nota um
biógrafo seu, “parece que havia nascido com uma aversão natural pelas máximas
desta abominável seita e a todos que pretendiam encaminhá-lo a ela. Prevenido
por uma graça oculta, igualmente desprezava, mesmo antes do uso da
razão, os afagos, carícias, solicitações bem como as ameaças, golpes e maus
tratos dos que desejavam, com a maior ânsia, instruí-lo desde cedo nos
elementos de sua heresia”.
Como os hereges
não tinham escolas na cidade, o pai enviou-o a um professor católico
para aprender as primeiras letras. Este semeou no coração do pequeno Pedro,
ávido das verdades eternas, os fundamentos da única Religião verdadeira, a
católica.
Certo dia, um tio
herege dos mais fanáticos, encontrou-se com o menino que voltava das
aulas, e o interrogou sobre o que estava aprendendo. Pedro inflamou-se então na
explicação do Símbolo dos Apóstolos (o Credo), que refuta o erro fundamental
daqueles hereges. Por mais que o tio argumentasse, o menino defendia com ardor
o que aprendera.
Preocupado, o
herege foi procurar o irmão e alertou-o no sentido de que, caso não impedisse o
menino de continuar a frequentar as aulas, este estaria perdido para a seita. O
pai de Pedro, seja por não ser dos mais fanáticos maniqueus, supondo talvez que
depois de adulto, ser-lhe-ia mais fácil convencê-lo, deixou-o com o professor.
E, mais tarde, enviou-o à Universidade de Bolonha.
"Era
lastimável a corrupção de costumes que reinava entre a juventude daquela
Universidade. E é verossímil que isto mesmo movesse o pai de Pedro a enviá-lo
para lá, parecendo-lhe que, uma vez que a licenciosidade de costumes lhe
estragasse o coração, seria então fácil apagar dele as impressões da doutrina
católica”.
Mas Deus
preservou-o do vício como o tinha protegido da heresia.
Foi em Bolonha que
Pedro tomou conhecimento de uma nova ordem de frades pregadores e de seu
fundador, Domingos de Gusmão, em cujo hábito, negro e branco, estão refletidas
as duas virtudes que ele mais amava: a
humildade e a pureza. Apesar de ter apenas 16 anos, o adolescente
apresentou-se a São Domingos, que o admitiu incontinenti no noviciado.
Após sua profissão
religiosa, Frei Pedro dedicou-se com afinco aos estudos, tornando-se capaz de,
em pouco tempo, receber a ordenação sacerdotal e “de subir no púlpito,
de atacar os hereges, e de parecer nas mais belas ocasiões para a defesa e
sustentáculo da Igreja. Ele se comportava com tanto zelo que, segundo os termos
de Santo Antonino, todas suas ações pareciam animadas de uma muito viva fé e
ardente caridade”.
Desde sua
ordenação, Frei Pedro pedia sempre no Santo Sacrifício da Missa a graça de
derramar seu sangue pela Fé.
Começou então a
parte verdadeiramente extraordinária de sua vida, que tem poucas similares na
História da Igreja.
Com um dom
especial para mover os corações mesmo dos pecadores mais endurecidos e dos
hereges, sua pregação era acompanhada de milagres portentosos. O que
convertia muitos, para desespero do inimigo infernal que procurava de todos os
modos impedi-lo de falar.
Alguns fatos extraordinários na sua vida:
Certa vez pregava
ele na praça do mercado de Florença, pois não havia igreja suficientemente
grande na cidade para conter a multidão que fora ouvi-lo. De repente, surgiu um
enorme corcel negro, correndo a toda brida em direção aos ouvintes, parecendo
disposto a esmagar tudo que encontrasse pela frente. O Santo, com o Sinal da
Cruz, dissipou como fumaça esse fantasma feito pelo demônio.
De outra feita,
depois de uma pregação, um rapaz pediu para se confessar. Acusou-se
de ter dado um pontapé em sua mãe. Frei Pedro repreendeu-o severamente,
dizendo-lhe que por esse ato ele merecia ter o pé decepado. O infeliz ficou
compungido, mas interpretou mal a admoestação do Santo, pois chegando em casa,
cortou o pé. Houve um vozerio contra Frei Pedro, acusado de imprudência. Este
foi até a casa do penitente, pegou-lhe o pé decepado, e com uma bênção juntou-o
de novo à perna!
Como os líderes
dos hereges estavam desesperados pelas perdas que sofriam, um deles resolveu
“desmascarar” o Santo. “Eu vou, disse ele aos seus, fingir-me de
doente, e me aproximar dele com a multidão; ele vai me
impor as mãos e dirá que eu estou curado. Então eu declararei sua impostura”. E
fez isso. Frei Pedro, no entanto, disse-lhe: “Se estás doente, sejas curado; se
não, fiques doente”. No mesmo momento, o homem foi atacado por uma terrível
febre, que o levou a um estado desesperador. Confessando sua falta, pediu ao
Santo que tivesse pena de sua alma e de seu corpo. Fez uma abjuração de seus
erros e foi curado.
Numa outra ocasião
um falso bispo dos maniqueus desafiou o Santo para um debate público. Como o
sol estava abrasador e ele não conseguia refutar os argumentos do Santo, para
provocá-lo e desviar o assunto, disse-lhe: “Por que não pedes ao teu Deus
que nos envie uma nuvem para nos proteger?”. - “Vou fazer da
melhor vontade, respondeu o servo de Deus sem hesitar, se me
prometeres abjurar tua heresia, caso vejas a oração ouvida”.
Isto foi aceito; então disse Frei Pedro: “Para conhecerdes todos, e
confessardes à uma, que o nosso Deus, único onipotente é o criador das coisas
visíveis e invisíveis, peço-Lhe, em nome de seu Filho Jesus Cristo, que nos
envie uma nuvem para nos defender dos raios do sol”. E ao fazer o sinal da
Cruz, imediatamente apareceu no céu sereno uma nuvem amena que aliviou a todos.
São Pedro de
Verona foi muito favorecido com visões celestes. As virgens e mártires Santa
Catarina, Santa Inês e Santa Cecília frequentemente lhe apareciam, e tinham com
ele familiar entretenimento. Isso foi-lhe causa de uma grande provação, pois um
dia um frade ouviu aquelas vozes femininas na cela do santo, e comunicou ao
Superior. Este, no capítulo, repreendeu Frei Pedro, que em vez de se defender,
disse apenas: “Sou um grande pecador”, pois, em sua humildade, não
queria que soubessem dos favores celestes que recebia. Foi então relegado a um
convento distante, com a proibição de sair e de pregar.
Certo dia, nessa
reclusão forçada, Frei Pedro lamentou-se amorosamente diante de um Crucifixo,
dizendo: “E, então, meu Deus! Vós, que conheceis minha inocência, como
podeis sofrer que eu permaneça tanto tempo na infâmia?”. Nosso Senhor
respondeu-lhe: “E eu, Pedro, não era inocente? Merecia os opróbrios e as
dores com que fui acabrunhado no curso de minha Paixão? Aprende assim de mim a
sofrer com alegria as maiores penas, sem ter cometido os crimes que te são
imputados”. Mas os superiores deram-se conta de seu erro e chamaram de
volta o grande pregador.
Em 1232 o Papa
Gregório IX, que conhecia o zelo e a pureza de doutrina de Pedro de Verona,
nomeou-o Inquisidor-Geral da Fé. Foi enviado a Florença para examinar uma Ordem
religiosa que estava surgindo, fundada por sete varões daquela cidade. Graças a
seu testemunho favorável, a Ordem dos Servos de Maria foi confirmada.
Frei Pedro de
Verona não combatia a heresia só com palavras mas “persuadiu os católicos a
se coligarem em uma espécie de cruzada para expulsar do país todos os hereges;
e, em menos de seis anos, logrou ver católica a Toscana inteira”.
Os hereges não se
conformavam com o desaparecimento de sua seita. Assim, coligaram-se para
exterminar aquele que tantos estragos fazia.
Por uma luz
sobrenatural, São Pedro conheceu que o momento de seu tão desejado
martírio estava próximo. E o disse a muita gente, por exemplo, a uma multidão
de 10 mil pessoas que o ouviam em Milão, no Domingo de Ramos.
No sábado seguinte
à Páscoa, como vimos, dirigia-se de Como, onde era Prior, para Milão, quando
foi martirizado aos 46 anos. Como foi o primeiro mártir da Ordem Dominicana, é
também conhecido como São Pedro Mártir, e foi imortalizado por seu irmão de
hábito, o célebre Beato Fra Angélico, em várias pinturas.
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