“A Liturgia desta santa noite de Natal nos
apresenta o nascimento do Salvador: como luz que penetra e dissolve a mais
densa escuridão. A presença do Senhor no meio do seu povo cancela o peso da
derrota e a tristeza da escravidão e restabelece o júbilo e a alegria.
Também nós,
nesta noite abençoada, viemos à casa de Deus atravessando as trevas que
envolvem a terra, mas guiados pela chama da fé que ilumina os nossos passos e
animados pela esperança de encontrar a «grande luz». Abrindo o nosso coração,
temos, também nós, a possibilidade de contemplar o milagre daquele menino-sol
que, surgindo do alto, ilumina o horizonte.
A origem das trevas que envolvem o mundo perde-se
na noite dos tempos. Pensemos no obscuro momento em que foi cometido o primeiro
crime da humanidade, quando a mão de Caim, cego pela inveja, feriu de morte o
irmão Abel (cf. Gn 4, 8). Assim, o curso dos séculos tem sido
marcado por violências, guerras, ódio, prepotência. Mas Deus, que havia posto suas expectativas no homem feito à sua imagem
e semelhança, esperava. Deus esperava. O tempo de espera fez-se tão longo
que a certo momento, quiçá, deveria renunciar; mas Ele não podia renunciar, não
podia negar-Se a Si mesmo (cf. 2 Tm 2, 13). Por isso,
continuou a esperar pacientemente face à corrupção de homens e povos. A
paciência de Deus... Como é difícil compreender isto: a paciência de Deus para
conosco!
Ao longo do caminho da história, a luz que rasga a
escuridão revela-nos que Deus é Pai e que a sua paciente fidelidade é mais
forte do que as trevas e do que a corrupção. Nisto consiste o anúncio da noite de Natal. Deus não conhece a explosão
de ira nem a impaciência; permanece lá, como o pai da parábola do filho
pródigo, à espera de vislumbrar ao longe o regresso do filho perdido; e todos
os dias, com paciência. A paciência de Deus!
Quando os anjos anunciaram aos pastores o
nascimento do Redentor, fizeram-no com estas palavras: «Isto vos servirá de
sinal: encontrareis um menino envolto em panos e deitado numa manjedoura» (Lc 2,
12). O «sinal» é precisamente a
humildade de Deus, a humildade de Deus levada ao extremo; é o amor com que
Ele, naquela noite, assumiu a nossa fragilidade, o nosso sofrimento, as nossas
angústias, os nossos desejos e as nossas limitações. A mensagem que todos
esperavam, que todos procuravam nas profundezas da própria alma, mais não era
que a ternura de Deus: Deus que nos fixa
com olhos cheios de afeto, que aceita a nossa miséria, Deus enamorado da nossa
pequenez.
Nesta noite santa, ao mesmo tempo que contemplamos
o Menino Jesus recém-nascido e reclinado numa manjedoura, somos convidados a
refletir. Como acolhemos a ternura de Deus? Deixo-me alcançar por Ele, deixo-me
abraçar, ou impeço-Lhe de aproximar-Se? «Oh não, eu procuro o Senhor!» –
poderíamos replicar. Porém a coisa mais
importante não é procurá-Lo, mas deixar que seja Ele a procurar-me, a encontrar-me
e a cobrir-me amorosamente das suas carícias. Esta é a pergunta que o Menino
nos coloca com a sua mera presença: permito a Deus que me queira bem?
E ainda: temos a coragem de acolher, com ternura,
as situações difíceis e os problemas de quem vive ao nosso lado, ou preferimos
as soluções impessoais, talvez eficientes mas desprovidas do calor do
Evangelho? Quão grande é a necessidade que o mundo tem hoje de ternura!
Paciência de Deus, proximidade de Deus, ternura de Deus.
A resposta do cristão não pode ser diferente da que
Deus dá à nossa pequenez. A vida deve
ser enfrentada com bondade, com mansidão. Quando nos damos conta de que Deus Se
enamorou da nossa pequenez, de que Ele mesmo Se faz pequeno para melhor nos
encontrar, não podemos deixar de Lhe abrir o nosso coração pedindo-Lhe:
«Senhor, ajudai-me a ser como Vós, concedei-me a graça da ternura nas
circunstâncias mais duras da vida, dai-me a graça de me aproximar ao ver
qualquer necessidade, a graça da mansidão em qualquer conflito».
Queridos irmãos e irmãs, nesta
noite santa, contemplamos o presépio: nele, «o povo que andava nas trevas viu
uma grande luz» (Is 9, 1). Viram-na as pessoas simples,
as pessoas dispostas a acolher o dom de Deus. Pelo contrário, não a viram os
arrogantes, os soberbos, aqueles que estabelecem as leis segundo os próprios
critérios pessoais, aqueles que assumem atitudes de fechamento.
Contemplemos o presépio e façamos este pedido à Virgem Mãe: «Ó Maria,
mostrai-nos Jesus!»
Papa Francisco 24 de dezembro de
2014
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