A
cidade de Montreal (Canadá) deve sua origem a um grupo de fiéis, homens e
mulheres da França do século dezessete, cujo sonho era levar aos povos do Novo
Mundo o que consideravam como seu bem mais precioso: sua fé. Foi com a
esperança de realizar este objetivo que estabeleceram uma colônia na ilha de
Montreal. Em maio de 1642 a Vila Maria era fundada na ilha de
Montreal. Margarida Bourgeoys chegou à nascente Vila Maria em 1653. A fundação
vivia então o temor de todos os perigos aos quais estava exposta.
A
chegada de Margarida, onze anos depois da fundação, realizava uma parte do
plano inicial, que previa a educação das crianças da colônia. Ela acompanhava o
“recrutamento dos cem homens”, com o qual se contava salvar Vila Maria, que em
1653 enfrentava uma tremenda alternativa: abandonar o novo posto ou aumentar
seus habitantes.
Com
aqueles homens e aquelas mulheres, compartilhava tanto os perigos e as
privações, como os esforços e as esperanças que marcavam o ritmo da vida da
colônia nascente. Como eles, era vulnerável às ameaças que a rodeavam: ataques
dos inimigos ou enfermidades, bem como as incompreensões das autoridades da
Igreja e do Estado, algumas vezes hostis ou incompetentes.
Como
muitos dos que participaram da direção dos trabalhos de fundação de Montreal,
Margarida Bourgeoys vinha de uma região da França onde desde a Idade Média as
mulheres colaboravam ativamente na sociedade. Ela estava convencida da
importância do papel das mulheres na colônia: nas mãos das educadoras, nas mãos
das futuras esposas e mães repousava o futuro do Canadá. Como consequência,
considerava sua educação como uma prioridade.
A
educação que Margarida e suas companheiras davam às crianças, meninos e meninas
no começo, bem como às mulheres da Nova França, era antes de tudo a educação da
fé. A fé que Margarida expressava tanto na sua vida como em suas palavras, era
a alma de todo seu ensinamento, era uma fé baseada no mandamento do Novo
Testamento: Amarás ao Senhor teu Deus de todo coração, de toda tua alma e
ao próximo como a ti mesmo.
Além
dos valores religiosos, Margarida preparava as crianças, em sua maioria filhos
dos colonos que edificavam Montreal, para o desafio de ganhar a vida para si e
para suas famílias e construir um país novo.
Margarida
nasceu no dia 7 de abril de 1620, em Troyes, antiga capital da Champagne, sexta
de doze filhos de comerciantes de cera. Na cidade natal frequentou a escola
elementar. Nas suas “Memórias” a Santa revela a sua vocação precoce. “Desde minha primeira juventude o Senhor me
deu uma particular inclinação para reunir as jovens da minha idade”. Com
elas não só jogava, como costurava e rezava.
Aos
dezenove anos, com a morte da mãe, Margarida assume a direção da casa.
Participando de uma procissão no primeiro domingo de outubro de 1640, Margarida
passou diante do portal da abadia e ergueu o olhar na direção de uma imagem de
Nossa Senhora. Por um instante o rosto da Virgem lhe pareceu vivo e sorridente,
e ela sentiu-se livre dos sentimentos de vaidade que a vinham acometendo. Ela
considerou sempre tal episódio como “a sua conversão”.
Para
corresponder à graça recebida, Margarida entrou na Congregação das Irmãs de
Nossa Senhora, fundada por São Pedro Fourier e ali fez os votos.
Seu
diretor espiritual, Monsenhor Jendret, lhe propôs a fundação de uma congregação
de religiosas que embora vivendo em comunidade trabalhassem no mundo a favor
dos pobres, dos doentes e dos ignorantes. Como tal empreendimento não fosse
momentaneamente levado adiante, Margarida retoma sua vida de oração e de
assistência aos pobres e doentes.
Em
1650, no dia da Assunção, prostrada em adoração ao Santíssimo Sacramento, viu,
ao lado da Hóstia, o Menino Jesus que lhe sorria sem nada dizer.
Um
dia recebe a visita do governador do Canadá, Paul Chomedey de Maisonneuve,
considerado pelos contemporâneos “um verdadeiro cavaleiro, forte e corajoso
como um leão e piedoso como um monge”, francês de origem, que propõe a
Margarida transferir-se para Montreal para abrir uma escola elementar.
Na
noite anterior, São Francisco aparecera à Santa em sonho acompanhado daquele
senhor. Ela não hesitou em colocar-se à sua disposição, no caso de seus
superiores consentirem. Os parentes procuraram retê-la, mas, no início de 1653,
embarcou para o Novo Mundo, sem dinheiro nem vestiário, não sem antes renunciar
legalmente à sua parte na herança. A viagem durou três meses e foi trágica: a
peste se espalhou a bordo e Margarida se tornou enfermeira, médica e sacerdote.
Em
Vila Maria, na ilha de Montreal, ao lado do forte onde Margarida se alojou,
surgira um pequeno hospital fundado pela Serva de Deus Jeanne Mance em 1645. As
duas heroínas da caridade logo se tornaram amigas e colaboradoras. A principal
ocupação da Santa era dar aulas aos filhos dos colonos, mas também seria
enfermeira no hospital e auxiliadora dos soldados mais pobres.
Escoltada
por trinta homens, fez reconstruir a grande cruz que Maisonneuve havia erigido
sobre a montanha vizinha, em cumprimento a um voto, e que os iroqueses tinham
abatido. Libertou o governador de grave tentação, exortando-o a cumprir o voto
de castidade. Enfim, idealizou a construção da primeira igreja de pedra
dedicada a Nossa Senhora.
Em
1658, após quatro anos de intensa atividade, Margarida conseguiu abrir a
primeira escola. Como os trabalhos se multiplicassem, a Santa pensou em
procurar na França jovens desejosas de servir a Deus no próximo. O seu plano
para o futuro constava de um pequeno instituto para as crianças indígenas, uma
associação para as jovens e um círculo para os jovens esposos, com a finalidade
de preparar boas mães de família. Encontrou quatro jovens na França dispostas a
segui-la, e a amiga Jeanne Mance ajudou-a a encontrar reforços para suas obras.
As
obras de Madre Bourgeoys foram se consolidando, o que lhe pareceu uma
confirmação da Providência para que ela realizasse a fundação da Congregação de
Nossa Senhora de Montreal. A doação de terras efetuadas em 1662 pelo governador
é uma nova forma de apoio à obra.
Para
obter autorização real e encontrar novas vocações, a Fundadora viajou novamente
para a França em 1670. Ajudada pela “Companhia de Montreal”, consegue ser
recebida por Luiz XIV, que lhe concedeu tudo que desejava. A única preocupação
da Madre era então dar uma formação religiosa ao seu Instituto, como ela anotou
em suas “Memórias”: “Nos é sempre lembrado que um certo espírito de
humildade, de simplicidade, de docilidade, de obediência, de pobreza, de
desprendimento de todas as coisas e de abandono à Divina Providência deve ser o
verdadeiro espírito da Congregação”.
O
primeiro Bispo de Quebec, Monsenhor de Laval, erigiu a Congregação em 1676.
Madre Margarida fundava uma das primeiras comunidades religiosas de mulheres
não enclausuradas da Igreja, as quais deviam prover as suas próprias
necessidades, e que sobrevivem até hoje. Sua característica é resultado da
experiência adquirida por Margarida ao longo do que se tem chamado “o período heroico
da história de Montreal”. Sua fonte de inspiração foi a Santíssima Virgem, que
ela considerava como a primeira e a mais fervorosa dos discípulos do Senhor,
ensinando e fazendo o bem na Igreja primitiva.
Se
fossemos perguntar a Madre Margarida qual foi o melhor momento de sua vida,
acreditamos que ela teria escolhido o período compreendido entre 1653, com a
saída de Paul de Chomedey de Maisonneuve e a chegada do batalhão de Carignan.
Foram anos de luta, de perigo, de privação e de prova; foram também anos de
esperança, de amizade e de sonhos compartilhados. Naqueles anos, Margarida
conhecia cada colono e cada mulher de Montreal, muitos dos quais intimamente:
ela era parte de suas vidas como eles eram da sua.
Durante
sua vida, a Congregação contou não somente com mulheres francesas, mas também
com norte-americanas de ascendência francesa, ameríndia e até inglesa. Sua ação
educadora se estendeu até Quebec e aos pequenos povoados ao redor de São
Lourenço.
Como
tantas outras fundadoras de congregações religiosas, Margarida é conhecida por
sua obra, para cuja realização sofreu a dupla prova de ter posta em dúvida sua
capacidade de realização, e de sentir-se terrivelmente indigna aos olhos de
Deus. Porém, sua coragem e seu ardente desejo de ajudar as crianças e a todos,
levou-a sempre para frente. Ela dizia: “Quero a todo custo não apenas
amar ao meu próximo, mas fazer-me amada por eles”.
Em
19 de setembro de 1693, aos 72 anos, Madre Margarida renunciou ao cargo de
superiora, quando suas forças começavam a declinar. Eis as palavras que dirigiu
à comunidade na ocasião:
“Agora
não se trata mais de falar de mim senão como uma miserável, que por não ter
sido fiel ao empreendimento que me foi confiado tão amorosamente, merece
grandíssimos castigos, que aumentaram ainda por causa da pena que meu
relaxamento vos fez sofrer. Peço-vos perdão e o auxílio de vossas orações.
Coloquem aqui o remédio enquanto for possível. É preciso mudar prontamente de
superiora, e a que for eleita faça observar exatamente a Regra, até nas maiores
minúcias, porque sem isto, que coisa se fará nesta comunidade diferente do que
fazem as pessoas do mundo que vivem cristãmente? Mantende-vos no espírito que
deveis ter, que é de pobreza, de mortificação, de obediência e de abandono nas
mãos de Deus”.
Nos
últimos anos de vida, Madre Margarida viveu serena e em perfeita conformidade
com a vontade de Deus.
Em
1698, após quarenta anos, o Senhor concedeu-lhe a alegria de ver sua
Congregação ser aprovada como ela a havia concebido: além dos três votos, as
religiosas fazem o de instruírem e educarem a juventude feminina.
Confinada
na enfermaria, a Fundadora se preparou para a morte cosendo, rezando e
exortando as Irmãs à fidelidade ao dever, à caridade e à observância da Regra.
O fim chegou de forma inesperada. No último dia do ano 1699, a fundadora
ofereceu sua vida para salvar a da mestra de noviças, que estava gravemente
enferma. A mestra de noviças recobrou a saúde e a Madre Bourgeoys morreu no dia
12 de janeiro de 1700.
Pio
XII a beatificou em 12 de novembro de 1950, e foi canonizada por João Paulo II
em 31 de outubro de 1982.
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