“Uma nova estrela se ergueu no firmamento da
Igreja.”
Com esta frase marcante, o então Cardeal Joseph Ratzinger deu início à homília,
proferida na véspera da beatificação de Ana Schäffer, em Roma, onde depois foi
canonizada, em 21 de outubro de 2012, pelo Papa Bento XVI.
Sua estrela refulge agora para toda a Igreja
Católica, espalhada pelo mundo inteiro.
A vida de nossa santa principiou em seu
povoado natal, Mindelstetten, situado a cerca de 20 km a norte de Ingolstadt,
Alemanha, onde nasceu em 18 de fevereiro de 1882. Foi criada em uma modesta
família de artesãos como a terceira de seis filhos; cursou o ensino
fundamental, obtendo sempre excelentes notas. Não pôde dar continuidade aos
estudos, pois em em janeiro de 1896, faleceu seu pai; nesse tempo, Ana já
trabalhava há meio ano como empregada doméstica numa casa em Regensburg,
Alemanha. Seguiram-se outros empregos, por fim,
na casa do guarda-florestal em Stammham.
Aí ocorreu
o acidente que lhe desmoronou tudo o que havia planejado para a vida. E como
data do sucedido foi registrado o dia 4 de fevereiro de 1901:
Era o dia da lavagem da roupa; conjuntamente
com outra empregada doméstica, Ana cuidava da roupa que havia sido fervida em
uma caldeira. O tubo de calefação havia-se soltado; Ana subiu na borda da
caldeira para consertá-lo. Nesse instante, resvalou e caiu na caldeira com a
barrela fervente, queimando as pernas até os joelhos. Foi levada de imediato
para o hospital municipal perto de Kösching; malograram todas as tentativas de
tratamento, de sorte que ela já não tinha esperanças em possível cura e
esperava apenas a morte.
Porém ainda não havia chegado a sua hora de
partir para a Casa do Pai; seu estado de saúde estabilizou-se, de forma que já
não corria risco de vida. Transcorridos três meses, recebeu alta do hospital,
pois nada mais havia a fazer por ela. Com esse acidente, principiou para Ana
uma penosa via-sacra. As dores causadas pelas queimaduras não cessaram; as feridas
nos pés não cicatrizaram, permanecendo chagas abertas, que supuravam
continuamente.
Ainda que haja sido regularmente assistida
por seu clínico geral, este não conseguia reverter-lhe o mísero quadro clínico;
outrossim as duas permanências – cada uma durante vários meses - na Clínica
Universitária de Erlangen não foram bem-sucedidas. Os tratamentos aí empregados
foram tão dolorosos que ela se apavorava ao relembrá-los. Amiúde tentavam
flexionar-lhe energicamente os tornozelos, que, devido à sua longa permanência
no leito, se haviam inteiriçado, para fazê-los novamente mover; contudo também
sem êxito algum.
Infância
Sua irmã
Kathi descreveu Ana como uma criança normal. Sua mãe, porém, afirmou que ela,
já quando criança, era diferente das crianças de sua idade; tinha por hábito
retirar-se de quando em vez para um recanto silencioso para rezar. Já cedo,
Deus começou manifestamente a colocar a mão sobre esta menina para atraí-la
lentamente a Ele.
No dia de
sua Primeira Comunhão, 12 de abril de 1893, Ana teve uma profunda experiência
de Deus, mas não a descreveu detalhadamente; anos mais tarde, observou apenas
que esse dia foi o dia mais belo de sua vida. Todavia, sob a impressão causada
por essa experiência, escreveu ainda no mesmo dia uma carta a Jesus, em que Lhe
fez algumas importantes promessas: “... faz de mim o que Te prover... Quero
reparar-Te e se quiseres, meu Jesus, faz com que eu seja um holocausto por
todas as desonras e ofensas que são cometidas contra Ti...”
Tal oferecimento feito a Nosso Senhor revelou
que Ana, com 11 anos de idade, já possuía um caráter que a capacitava para
enfrentar tudo em prol de um ideal. Com a sua entrega a Deus, talvez haja
pensado ingressar em uma ordem religiosa e servi-Lo como religiosa missionária;
e não, sem dúvida, no que, posteriormente, sucedeu, pois, pelo menos ao longo
de dois anos após o acidente, esperava vir a ser curada.
Juventude
Quando
contava com dezesseis anos de idade, Ana Schäffer consagrou-se a Nossa Senhora.
Na fórmula de sua consagração diz o seguinte: “Eu... Te escolho hoje para
advogada e intercessora minha, e faz com que eu nunca Te abandone...”
Durante toda a vida, cultivou uma relação extremamente íntima com Maria
Santíssima, que a ajudou a perseverar em sua via-sacra. Posteriormente, a
Virgem Maria aparecia-lhe amiúde em sonhos.
Em junho
de 1898, Ana Schäffer teve uma experiência visionária que a abalou profundamente.
Ela mesma a escreveu: apareceu-lhe Jesus
na figura do Bom Pastor, anunciando-lhe um longo e árduo sofrimento. “Ele
tinha um terço na mão; falou-me outrossim da oração do Santo Terço e que eu não
completaria vinte anos de idade e que teria de sofrer muito, muito...” No
dia imediato, Ana, em pânico, deixou Landshut, e ninguém conseguiu convencê-la
a regressar ao local de trabalho. Humanamente falando, foi compreensível tal
reação. Outrossim posteriormente nunca procurou o sofrimento, apenas aceitou-o
com resignação.
Maturidade
Em uma
carta, Ana insinuou que havia lutado cerca de dois anos para dizer sim a seu
árduo destino e nele reconhecer a vontade de Deus, tal como o havia prometido
em seu propósito da comunhão.
Depois de nove anos e meio de seu acidente –
em 4 de outubro de 1910 – Jesus lhe confirmou em uma visão: “Aceitei-te
para expiação de meu Santo Sacramento. E na recepção da Sagrada Comunhão deves
doravante sentir as dores de Minha Paixão, com as quais te redimi, misero nada.
Sofre, oferece e expia no silêncio do escondimento”.
Na manhã desse dia, enquanto recebia a
Sagrada Comunhão das mãos de seu pároco, cinco raios de fogo, quais relâmpagos,
atingiram-lhe as mãos, os pés e o coração. Sobre isso escreveu o seguinte: “De
imediato começou uma dor imensa nessas partes do corpo. Esse sofrimento, pude
padecê-lo sem interrupção desde outubro de 1910. E, em certos dias, é amiúde
bem maior, principalmente às quintas e sextas-feiras, aos domingos e dias
santos.”
Com isso,
Nosso Senhor enobreceu o sofrimento de Sua serva, unindo-o ao Seu. Ela mesma
procurava – uma vez que já tinha de sofrer – imitá-Lo: não na revolta ou no
questionamento, senão na entrega, no espírito de sacrifício, no amor. No final da carta, escreveu: “No
sofrimento, aprendi amar-Te!”. É o caminho mais árduo, mas também o
caminho sublime do seguimento de Cristo.
Nessa
atitude, sua oração foi-se tornando sempre mais profunda e substancial,
levando-a, por vezes, até a experiência mística. Para ela, o Santo Terço foi
uma visão da vida de Cristo Jesus. E quando ante dores não era capaz de fazer
longas orações, enviava para o Céu jaculatórias, quais suspiros lancinantes;
Nosso Senhor concedeu-lhe então a graça da oração contínua, de sorte que não
precisava outrossim prescindir da presença dEle quando recebia visitas e com
elas conversava.
A maior
parte dessa força, ela a hauria da recepção da Sagrada Comunhão quase diária. A
esse respeito escreveu: “Não há pena alguma com que eu possa
escrever, o quanto sou feliz após cada Sagrada Comunhão... Nessas horas sou tão
feliz que não quero trocar meu leito de sofrimento com nenhuma princesa pelo
mundo inteiro...”
Cada vez
mais, Ana ia crescendo para a atitude do amor que assumiu de Nosso Senhor; isso
a capacitava para dedicar-se às necessidades e intenções do próximo; escrevia
cartas encorajantes; recebia visitas; acolhia suas intenções e prometia rezar
por elas.
Ela que era tão desamparada, que por suas
próprias forças não conseguia suster-se, foi-se tornando cada vez mais uma
auxiliadora para muitos. No ocaso de sua vida, subsistia quase apenas de sua
entrega e de seu amor a Deus; o sofrimento foi-se tornando para ela um meio, um
capital que empregava para fortalecer sua oração em prol do próximo.
Nisso foi-se tornando cada vez mais
semelhante a Jesus; assim foi ela ao encontro de sua perfeição. E no dia 5 de
outubro de 1925, o Senhor veio buscá-la para o Seu Reino. No momento de sua
morte, rezou, uma vez mais, com as últimas forças: “Jesus, eu Te amo!”
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